Mercado de trabalho qualifica-se com ‘voz feminina’
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A força de trabalho em Portugal está cada vez mais qualificada, e este progresso tem sido impulsionado sobretudo pelas mulheres. Os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), referentes ao 4.º trimestre de 2024, mostram que o número de trabalhadores com ensino superior atingiu um máximo histórico, fixando-se nos 1,821 milhões. Trata-se de um aumento de 51% em relação a 2014, quando o número de licenciados, mestres e doutores na população activa era de 1,287 milhões.
O aumento líquido da população activa com pelo menos a licenciatura foi de 533,8 mil em apenas uma década, superando mesmo o crescimento da população activa absoluta que cresceu apenas 520,5 mil. Esta situação deveu-se ao facto de, por via da saída do mercado de trabalho das pessoas menos qualificadas, observarem-se reduções significativas. Assim, observou-se uma redução de 70,2 mil para 34,9 mil de trabalhadores no mercado de trabalho sem qualquer formação, enquanto aqueles que têm apenas o primeiro ciclo do ensino básico diminuíram de 652,2 mil para 354,1 mil, e os que têm o segundo ciclo diminuíram de 669,6 mil para 503,9 mil na última década.
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Os únicos dois grupos que aumentaram foram os das pessoas com o ensino secundário e com o ensino superior, embora este segundo grupo tenha passado a dominar nos últimos dois anos. Se no final de 2014, representavam 50,5% da população activa, agora ultrapassam os 67%. Considerando apenas a população activa com ensino superior concluído, no final do ano passado representavam já 34% do total, uma subida de 9,3 pontos percentuais face ao último trimestre de 2014.
Mas o aspecto mais marcante desta evolução da última década é o reforço da contribuição das mulheres na qualificação do mercado de trabalho em Portugal. Embora o peso relativo das mulheres se tenha mantido estável – passou de 49,2% para 49,6% ao longo dos últimos 10 anos –, o aumento em termos absolutos faz-se notar na formação. No quarto trimestre de 2014, de acordo com o INE, havia 750,6 mil mulheres com ensino superior; dez anos depois, esse número subiu acima de 1,1 milhões, um crescimento de 47%. No caso dos homens, passaram de 488 mil para 772 mil, uma subida de 58%, mas em termos absolutos menos significativa do que a das mulheres. De facto, em termos líquidos, o aumento de 640 mil licenciados no mercado de trabalho veio de 356 mil mulheres e 284 mil homens.
O peso feminino na força de trabalho qualificada é inegável. Enquanto os homens continuam a ser maioria nos níveis de escolaridade mais baixos, as mulheres já dominam o ensino superior. No total, 40,5% das mulheres activas têm um grau académico superior, contra 27,8% dos homens. Em finais de 2024, esses valores eram, respectivamente, de 30,6% e 19,2%. Ou seja, o fosso entre os dois sexos ainda aumentou mais 1,3 pontos percentuais, favorável às mulheres.
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Esta disparidade confirma um padrão que já se vinha a consolidar há décadas no sistema educativo português, onde as raparigas superam consistentemente os rapazes nos resultados escolares e na frequência universitária. A maior qualificação das mulheres no mercado de trabalho não é um fenómeno isolado. O sistema educativo português há muito que reflecte essa tendência, com as alunas a obterem melhores resultados escolares e a prosseguirem mais os estudos do que os seus colegas masculinos. Os números do INE confirmam que essa vantagem académica se traduziu, na última década, numa transformação estrutural da força de trabalho portuguesa.
No entanto, este progresso ainda não encontra eco de forma proporcional nos salários ou mesmo no acesso a cargos de topo. A disparidade salarial entre homens e mulheres mantém-se, tal como a menor presença feminina em funções de liderança nas empresas e no sector público. O crescimento da qualificação das mulheres é, assim, um avanço inegável, mas que levanta novas questões sobre a efectiva valorização das suas competências no mercado de trabalho.