LÍDER DO LIVRE GARANTIU QUE BOLSONARO ROUBOU JÓIAS

Polígrafo mentiu para garantir que Rui Tavares só dizia verdades

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Pedro Almeida Vieira|12/06/2025

O Polígrafo – o órgão de comunicação social dedicado ao fact-checking e que se arvora de “guardiã da verdade”, distribuindo selos, incluindo “pimenta na língua” – foi apanhado a martelar factos, classificando como verdadeira uma afirmação falsa de Rui Tavares, co-líder e deputado do Livre.

Numa deliberação ontem divulgada, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) reconheceu formalmente que o Polígrafo violou o dever de rigor informativo ao validar, sem a devida contextualização, uma afirmação de Rui Tavares durante o debate televisivo para as recentes eleições legislativas, no qual confrontou André Ventura, presidente do Chega.

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Para apurar quem faltara mais à verdade no frente-a-frente, o Polígrafo escolheu cinco afirmações dos dois políticos, tendo “sentenciado” que Ventura mentiu em duas, enquanto Tavares teria dito cinco verdades. Só que não. Tavares afirmou no debate que, durante o mandato de Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, “até roubo de jóias houve”. Ora, o Polígrafo classificou tal afirmação como “verdadeira”, justificando-se com investigações em curso no Brasil relativas a jóias recebidas por Bolsonaro durante o exercício da presidência, para além da condenação de inelegibilidade por oito anos. Contudo, como se depreende da própria ERC, quem mentiu foi o Polígrafo.

De acordo com a deliberação do regulador, é certo que “em Julho de 2024 foi tornado público e profusamente noticiado que a Polícia Federal [do Brasil] denunciara Jair Bolsonaro por apropriação indevida de jóias que recebera enquanto chefe de Estado, considerando que se trata de património público”.

Porém, “o caso levou a uma decisão do Tribunal de Contas do Brasil (TCU), de Março de 2025, que considerou que presentes de uso pessoal, recebidos por presidentes e vice-presidentes, não são património público, podendo mantê-los ao saírem do cargo”, acrescentando ainda que se “aguarda, entretanto, parecer da Procuradoria-Geral da República que pode seguir diversas vias: denúncia ao Supremo Tribunal Federal – cuja decisão não é influenciada pela posição adoptada pelo TCU –, pedido de novas diligências ou arquivamento”.

Aliás, nessa decisão de Março passado, acabou por fazer uma equivalência das ofertas recebidas por Bolsonaro ao que Lula da Silva tinha feito em 2005, quando ficou com um relógio oferecido enquanto líder do Estado brasileiro.

Nada disso é referido na análise do Polígrafo. Ao invés, para fundamentar a classificação de “Verdadeiro” à frase de Rui Tavares, o Polígrafo escreveu: “Bolsonaro deveria ter entregue [sic] essas jóias ao Estado brasileiro assim que deixou o poder, uma vez que estas foram uma oferta institucional. De acordo com as investigações, porém, Jair Bolsonaro vendeu algumas dessas jóias através de intermediários.”

Assim sendo, a ERC conclui ser “forçoso concluir que o Polígrafo incumpr[iu] o dever de rigor informativo na verificação de factos publicada”, embora destaque sobretudo a ausência de “contexto suficiente para que os leitores compreendam os contornos reais” da alegada apropriação e venda de jóias.

Polígrafo, um verificador de factos que transforma mentiras em verdades.

Em todo o caso, o regulador reforça a censura ao acto do Polígrafo tendo em conta o facto de este ser um “órgão de comunicação social reconhecido como verificador de factos certificado e assim apresentado aos olhos do público”, pelo que tem “o dever e a responsabilidade de manter os padrões que lhe são impostos, quer pela legislação e pela ética que impendem sobre o exercício da actividade jornalística, quer pelos padrões exigidos pelas organizações certificadoras de verificadores de factos IFCN – International Fact-Checking Network – e EFCSN – European Fact-Checking Standards Network”. Recorde-se que o Polígrafo tem o Facebook – que teve um papel fulcral na limitação da expressão durante a pandemia – como um dos seus principais financiadores.

Esta deliberação da ERC não impõe sanções, limitando-se a um “alerta” ao Polígrafo. Mas a marca ficou.
Para os cidadãos atentos, ficou provado que os verificadores também precisam de ser verificados. E que Rui Tavares, afinal, também mente. Aliás, uma outra frase do co-líder do Livre, no calor do debate, também está longe da verdade: por mais defeito que tenha, Bolsonaro não foi condenado (ainda) por corrupção, logo não é verdade que seja “o mais corrupto da América do Sul”.

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