GOVERNO REGIONAL DECIDIU, DESTA VEZ, FAZER CONTRATO DUPLO
Foguetório da Madeira vai queimar 182 mil euros por minuto nas duas próximas passagens de ano

Começa a ser um clássico, mas um clássico que espelha as prioridades do país. A Madeira prepara-se para voltar a iluminar o céu com o espectáculo de fogo-de-artifício que se tornou marca turística do arquipélago, mas também símbolo de uma relação contratual que parece inscrita em pedra: a Macedos Pirotecnia, uma empresa de Felgueiras, foi mais uma vez escolhida pelo Governo Regional para o espectáculo de fogo-de-artifício da Passagem de Ano, sempre por ajuste directo.
Porém, este ano há uma inovação: em vez de um, a empresa de pirotecnia já tem, além do espectáculo de 2025/2026, a garantia de sacar também o do próximo ano. Mas quem pense que o “dois em um” dá direito a desconto desengane-se: a Madeira terá um dos espectáculos mais caros de sempre.

Segundo o contrato celebrado na passada semana, o fogo-de-artifício de 2025/2026 custará 1.154.999,97 euros, enquanto o de 2026/2027 ascenderá a 1.212.696,00 euros — valores sem IVA. Aplicando a taxa de 23%, o custo efectivo para os cofres públicos sobe para 1.420.649,96 euros (2025/2026) e 1.491.616,00 euros (2026/2027). No total, o Governo Regional desembolsará mais de 2,9 milhões de euros para dois espectáculos que, cada um, durará cerca de oito minutos. ↓
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O ritmo de combustão do orçamento regional é impressionante: somando IVA, o custo médio por minuto do fogo-de-artifício destas duas celebrações será, em média, de 182.283 euros por minuto. Em termos práticos, cada segundo queimará mais de 3.000 euros em artefactos pirotécnicos, lasers e elementos luminosos — uma fasquia praticamente inédita no país.
A dimensão do espectáculo, descrita todos os anos pelo Governo Regional como “um dos melhores do mundo”, mantém a estrutura habitual: dezenas de postos de queima distribuídos pelo anfiteatro do Funchal, pelo Cais 8, pela Praia Almirante Reis e pela cidade de Vila Baleira, no Porto Santo. Em edições recentes, o dispositivo envolveu 59 postos de lançamento, sincronizados com música, lasers e efeitos audiovisuais que antecedem a explosão coreografada que marca a derradeira contagem decrescente.
O Governo Regional insiste que o investimento se justifica pelo retorno turístico, apresentando o espectáculo como uma das principais atracções do arquipélago. Mas os números revelam uma trajectória ascendente e constante nos custos: se em 2013/2014 a Madeira pagava cerca de 774 mil euros, sem IVA, pelo fogo-de-artifício, em 2017/2018 o valor subia para 837 mil euros, e a partir de 2018 instalou-se a fasquia do milhão de euros por ano. Agora, em 2026/2027, o valor contratual aproximar-se-á de 1,5 milhões de euros com IVA incluído.
Mais notório ainda é o facto de, ao longo de mais de dez anos, a adjudicação ter recaído sempre sobre a mesma empresa. Entre concursos públicos e ajustes directos, a Macedos Pirotecnia nunca encontrou concorrência capaz de lhe disputar a Passagem de Ano madeirense. Desde 2021, o Governo Regional optou mesmo por ajustar directamente espectáculos por a empresa de Felgueiras ter vencido concursos de concepção.
Saliente-se que os montantes para as duas próximas passagens de ano não são exclusivamente para o Funchal. No lote de 2025/2026, a sessão do Porto Santo custará 92.400 euros, enquanto a do Funchal representa 1.062.600 euros. No lote de 2026/2027, os valores sobem para 96.966 euros (Porto Santo) e 1.115.730 euros (Funchal). Ambas as parcelas são acrescidas de IVA.

A pergunta que se coloca não é apenas quanto custa o espectáculo, mas quem ganha — e há quanto tempo. A persistência de um único adjudicatário, ano após ano, é pouco comum num mercado onde, teoricamente, outras empresas nacionais e internacionais poderiam concorrer. No entanto, na Madeira, o fogo-de-artifício de Passagem de Ano tornou-se um território exclusivo, onde nada muda exceptuando o preço.
Com uma duração de apenas oito minutos, o espectáculo tornou-se um caso singular em Portugal: nenhum outro evento público consome — e literalmente — verbas desta magnitude num intervalo tão curto.