EDITORIAL DE PEDRO ALMEIDA VIEIRA
A calúnia, ou como as hienas, medrosas por natureza, se agigantam em grupo

A ‘coisa’ faz-se de forma tão concertada e com tal má-fé que nem se disfarça. Em pouco mais de uma semana, depois de termos revelado que um juiz quis saber como passo os tempos livres e que um pivot desvairado da CNN Portugal pediu ao Ministério Público o encerramento do PÁGINA UM (e a ERC, pressurosa, abriu-me um processo), continuámos a fazer aquilo que apenas sabemos fazer: revelar o que a outra imprensa não revela.
Foi assim que, na semana passada, voltámos a um tema que causa urticária a certos médicos e influencers sanitários (com ligações pouco recomendáveis): desmontei um ignóbil artigo (pseudo)científico de Filipe Froes na Acta Medica (revista científica da Ordem dos Médicos) e expus um estudo exaustivo de John Ioannidis que demonstra como, afinal, em três anos, as vacinas contra a covid-19 salvaram cerca de 12 milhões de pessoas a menos do que o estimado, para um único ano, por um modelo financiado pela Fundação Gates.

Era previsível receber respostas discordantes. O que veio, porém, foi um desfile de ataques pessoais, rótulos fáceis e “argumentos” que dispensam qualquer argumentação. Por exemplo, o enfermeiro Nuno André Macedo, candidato do Bloco de Esquerda e do Livre à Assembleia Municipal do Seixal, resolveu desenterrar um artigo meu de Outubro de 2023 sobre a campanha de marketing das farmacêuticas, com apoio da imprensa, para convencer o Estado a imunizar todos os recém-nascidos com um novo anticorpo monoclonal. Acompanhou-o de um printscreen (sem ligação) e desta pérola: ↓
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“Os chalupinhas são perigosos mas divertidos. Dizer que o VSR é inócuo quando é a maior causa de internamento em pediatria, de UCI pediátrica, e das maiores nos seniores, é mesmo para rir de tão ignorantes que são. O NIRSEVIMAB não é o primeiro anticorpo contra o VSR.”
O ataque é gratuito e reles — e eu ainda pensava que na esquerda havia uma certa ética, mas isso deve ser coisa de antanho —, mas também é mentiroso. Em parte alguma escrevi que o vírus sincicial respiratório é inócuo. Pelo contrário, afirmei que é “geralmente benigno, excepto em prematuros ou recém-nascidos com problemas respiratórios e cardíacos”, e que “não existe registo, em Portugal, de qualquer morte tendo o VSR como causa”. Também não disse que o niservimab é o primeiro anticorpo monoclonal; mencionei o palivizumab, administrado apenas a bebés vulneráveis e cuja eficácia é contestada por diversos estudos.

Mas que importa a verdade a quem nem honra a ideologia que apregoa? No habitual efeito de rebanho, atrás de uma hiena surge sempre outra. Apareceu então o influencer Luís Ribeiro, com carteira de jornalista, a ecoar as mentiras do Macedo, acrescentando insinuações sobre a minha higiene e acusando-me de ser “odiento”. Seguiu-se, na habitual procissão, uma cronista do Público — XXX Garcia —, que também não resistiu a lançar referências paternalistas e pouco abonatórias. Os chacais juntam-se sempre quando pressentem sangue, ainda que a “caça” seja apenas a verdade inconveniente.
Pode dizer-se que estes episódios não passam de patetices. Mas de patetice em patetice, têm um propósito pernicioso: estes influencers — porventura alinhados ou contratados — recorrem à mentira para, em momentos-chave, tentar descredibilizar quem cria rupturas no status quo. Não é coincidência que, precisamente hoje, o LinkedIn tenha decidido censurar a divulgação da notícia sobre o estudo de Ioannidis, certamente por o post ter sido ‘metralhado’ de denúncias. As hienas e os chacais, medrosos por natureza, agigantam-se em grupo.
O já desusado “chalupa” e a sua derivação “chalupice” continuam, em 2025, e em Portugal, tristemente vivos em certas cliques como táctica de ataque. É a estratégia mais cómoda: se não se quer — ou não se consegue — discutir o mérito das questões, chama-se um nome feio, fecha-se a caixa de comentários e passa-se ao próximo tema.

Apesar de tudo, é fascinante observar como a Medicina e o mundo das farmacêuticas continuam a provocar tanta baixeza. E o problema não é apenas económico: é conceptual. O debate sobre Saúde Pública foi reduzido a um simplismo clínico e hospitalocêntrico, ignorando princípios básicos da epidemiologia, da saúde populacional e, sobretudo, da gestão racional de recursos. A ideia de que se pode administrar, a torto e a direito, determinados fármacos sem aplicar o princípio da precaução — tratando seres humanos como gado veterinário — é não só insustentável como perigosa.
Pior ainda é tentar fazer crer que questionar terapias génicas ou a universalização de anticorpos monoclonais em pessoas saudáveis equivale a ser “anti-vacinas”. Ao contrário das vacinas, que induzem imunidade activa e memória imunológica, estes fármacos oferecem apenas imunidade passiva e temporária, com o risco acrescido de criar gerações menos preparadas para enfrentar agentes patogénicos na idade adulta, quando certas infecções podem ser mais graves.
Este raciocínio raramente encontra espaço no debate mediático. A imprensa mainstream, sequestrada economicamente por farmacêuticas e influencers sanitários, evita o incómodo de confrontar interesses, contratos, custos e eficácia real. Mais fácil é gritar “chalupa” e encerrar a conversa.

E é precisamente aí que a minha crítica incomoda: não aceito pacotes fechados de “verdades” impostas pelo marketing farmacêutico ou pela preguiça intelectual de muitos profissionais e comentadores. Questionar é uma obrigação. Recusar a aplicação de tratamentos veterinários a seres humanos é, mais do que bom senso, uma questão de responsabilidade.
Se estes ataques de carácter servirem para que alguns leitores percebam que a discussão sobre Saúde Pública não pode ser sequestrada por quem a reduz a protocolos clínicos e slogans publicitários, então já terão valido a pena. Mas convém que todos entendam: chamar nomes não muda a realidade nem apaga os números. E os números, infelizmente para alguns, continuam a mostrar que dar anticorpos caros a todos os bebés para chegar exactamente ao mesmo número de mortes — zero —, para gáudio dos accionistas e colaboradores das farmacêuticas, não é Ciência, nem boa Medicina. É marketing.