OPINIÃO
Um pasquim chamado Público (e o problema daqueles que o seguem)

A palavra “pasquim” vem do italiano pasquino, a estátua romana do século XVI onde se pregavam libelos satíricos — as famosas pasquinatas — que troçavam do poder e da Igreja. Com o tempo, passou a significar escrito maldoso, anónimo, e em português ficou sinónimo de jornal de má qualidade, daqueles que se enchem de opinião mas esvaziam-se de ética.
Assumamos, pois, que, por derivação de sentido, um pasquim possa, em pleno século XXI, também ser chamado sem pejo a um jornal que se contorce para ignorar as notícias dos outros, não por falha, mas por birra, por despeito, por ódio de estimação. Um pasquim é assim um jornal que prefere enganar os seus leitores fingindo que descobriu sozinho aquilo que alguém noticiou dias antes. Um pasquim é, em suma, um jornal que tem a mania da exclusividade, mas vive à boleia do trabalho alheio.

Ora, no sábado, o PÁGINA UM publicou em exclusivo — e depois do acesso ao relatório integral de 59 páginas da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) — a notícia de que o cirurgião Pedro Cavaco Henriques foi sancionado com 40 dias de suspensão aplicada ao cirurgião Pedro Cavaco Henriques por cinco infracções graves cometidas em apenas três meses. ↓
O jornalismo independente (só) depende dos leitores.
Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro.
Publicámos a notícia no sábado, com toda a prudência exigida: não inventámos, não especulámos, só escrevemos depois de ter acesso ao texto integral, lemos, analisámos e noticiámos. relatando os factos, mas sem expor nomes de doentes ou detalhes clínicos.
No domingo, reforcei o tema num editorial com o título “Quem quer estar sob o bisturi do doutor Pedro Miguel Mendonça Felício Cavaco Henriques?”, lido por mais de dez mil pessoas no nosso site e com mais de 30 mil visualizações nas redes sociais.

E a imprensa mainstream? Silêncio. Três dias de silêncio, como quem finge que o assunto não existe. Até que hoje, oh eureka!, houve um pasquim, outrora jornal de referência, que insiste em se chamar Público, que ‘descobre’ o caso nas redes sociais da médica denunciante e escreve como se tivesse descoberto a pólvora. Como se tivesse trabalhado, investigado, apurado. Como se fosse jornalismo de referência. Como se não houvesse um outro jornal a fazer a ‘cacha’, cumprindo regras éticas.
E depois, como tem sido hábito, a restante imprensa — a SIC e TVI, neste caso — correu atrás da “notícia” do pasquim, ignorando quem realmente a trouxe a público e aliviada por assim não ter de citar o PÁGINA UM.
Este é o modus operandi dos pasquins: apagar o trabalho dos outros para parecer indispensável. Mas há um problema para os pasquins de serviço: os leitores começam a perceber o truque. E quando perceberem de vez, vão tratar esses pasquins como aquilo que são: panfletos de agenda, mais preocupados com o seu prestígio do que com a verdade.

Se o Público e os seus directores têm engulho em citar o PÁGINA UM, se lhes causa urticária reconhecer que um jornal pequeno lhes está a dar lições de jornalismo, têm uma alternativa simples: deixem de ser pasquim. Façam jornalismo, com rigor e sem promiscuidades.
Independentemente disso, como sempre fizemos, o PÁGINA UM citará o Público quando o Público merecer ser citado. Mas enquanto for um pasquim, chamá-lo-emos pasquim. Porque pasquim se mostra, pasquim será.
N.D. Esta tarde, escrevi à jornalista do Público, Inês Schreck, lamentando que tenha ignorado a ‘cacha’ do PÁGINA UM. A jornalista, com 23 anos de experiência, ignorou o e-mail.