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TVI e CNN Portugal querem esconder os seus dados financeiros do escrutínio público

black plastic frame on brown wooden floor

por Pedro Almeida Vieira // Julho 5, 2022


Categoria: Imprensa

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Uma das funções da Imprensa é revelar aquilo que muitos querem esconder, mas a dona da TVI e CNN Portugal pediu este ano à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que todos os dados que revelam a sua saúde financeira em 2021 não constem do Portal da Transparência.


A TVI – Televisão Independente S.A. – a empresa detentora da TVI e da CNN Portugal, que se encontra no universo da Media Capital – pediu à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que os seus indicadores financeiros fossem considerados confidenciais no Portal da Transparência dos Media.

Esta informação, com a indicação de a ERC estar a analisar o pedido da empresa, consta daquela base de dados (à data de hoje) que, por ironia, foi criada em 2016 exactamente para revelar publicamente informação sobre os proprietários de órgãos de comunicação social e a sua situação financeira.

José Eduardo Moniz consta como responsável editorial da TVI – Televisão Independente S.A. no Portal da Transparência da ERC.

O PÁGINA UM tentou obter mais detalhes sobre os motivos por detrás daquele pedido junto da ERC e da Media Capital, mas não obteve ainda qualquer resposta.

De acordo com um diploma legal de Abril de 2016, as entidades que, sob forma societária, prossigam atividades de comunicação social devem enviar anualmente à ERC um relatório de governo societário, incluindo dados sobre o capital próprio, activo total, passivo total, resultados operacionais, resultados líquidos (lucro), rendimentos totais e passivos (totais e contingentes).

Também deve constar a relação das pessoas singulares e/ ou colectivas que representem mais de 10% dos rendimentos totais e dos passivos, com as respectivas percentagens. A data-limite para o envio dessa informação à ERC, relativo ao exercício mais recente, é o dia 30 de Junho de cada ano.

No entanto, a legislação prevê que, “atendendo à sensibilidade e ao caráter sigiloso de alguns dos dados solicitados” – que, na verdade são públicos, por outras vias –, “as entidades poderão solicitar à ERC a aplicação do regime de exceção”, ou seja, podem requerer sigilo, embora o regulador tenha o poder de “rejeitar o pedido (…), desde que por motivos devidamente fundamentados”.

Porém, numa consulta do PÁGINA UM ao Portal da Transparência da ERC, nenhuma das empresas que detém algum dos principais órgãos de comunicação social portugueses – Cofina (Correio da Manhã e CMTV), Impresa (SIC e Expresso), RTP, Lusa, Global Media (Diário de Notícias e Jornal de Notícias), Rádio Renascença, Avenida dos Aliados (Porto Canal), Benfica TV, Trust in News (Visão) – solicitou este ano um regime de excepção para “esconder” dados financeiros. Nem consta que em outros anos tenha sido solicitada e concedida pela ERC esse regime de excepção.

Curiosamente, até mesmo a Rádio Comercial S.A. divulgou a totalidade dos indicadores das suas demonstrações financeiras do ano de 2021. Com efeito, a dona da Rádio Comercial está sob alçada da Media Capital Digital, uma empresa-irmã da TVI – Televisão Independente S.A., e ambas estão na esfera da MEGLO, que integra, por sua vez a holding Media Capital.

Printscreen do Portal da Transparência da ERC sobre a informação financeira da TVI – Televisão Independente para o ano de 2021.

A confidencialidade solicitada pela dona da TVI e da CNN Portugal à ERC torna ainda mais densa a real dimensão do estado financeiro daqueles dois canais televisivos. Recorde-se que em 2020, a empresa apresentou um prejuízo de quase 7,3 milhões de euros, e viu o seu capital próprio descer de 54,9 milhões de euros em 2017 para 25,1 milhões em 2020.

Deste modo, mais de metade do seu capital “voou” em apenas três anos. Para agravar, endividou-se em quase 30 milhões de euros neste período, com o passivo a subir de 56,4 milhões de euros em 2017 para cerca de 85,6 milhões em 2020. No ano passado, e empresa terá tido necessidade de reforçar o investimentos e custos operacionais em virtude da transformação da TVI 24 em CNN Portugal.

Printscreen do Portal da Transparência da ERC sobre a informação financeira da TVI – Televisão Independente para o ano de 2020.

Apesar do secretismo requerido à ERC, o relatório e contas consolidado da Media Capital relativo a 2021 mostram que a situação da TVI – Televisão Independente ter-se-á agravado substancialmente. Mesmo com um aumento apreciável dos rendimentos operacionais (incluindo publicidade) a subir para os quase 131 milhões de euros (mais cerca de 17 milhões de euros face a 2020), os resultados operacionais foram negativos em quase 7,4 milhões de euros.

Deste modo, os dois canais televisivos acabaram por serem responsáveis pelas contas a vermelho da holding. Em 2021, a Media Capital apresentou um prejuízo de 4,1 milhões de euros, a que se juntam os 11 milhões já registados ao longo de 2020.


N.D. A empresa detentora do PÁGINA UM – a Página Um, Lda. – encontra-se também registada no Portal da Transparência da ERC, mas como a sua constituição só ocorreu em Abril deste ano, apenas poderá informar da sua situação financeira após a conclusão de 2022, o seu primeiro ano económico.

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