Ursula von der Leyen discursou esta manhã em Bruxelas uma boa horita. Ou como Fidel lhe chamaria, “uns bons cumprimentos iniciais”.
Garantiu algumas coisas que me deixaram deveras descansado, logo a mim, confesso contribuinte europeu preocupado.
Desde logo disse que “Putin falhará e a Ucrânia e a Europa prevalecerão”, e que as sanções à Rússia são para manter, e que as ajudas financeira e militar para a Ucrânia são para manter. Positivo: até porque, como se tem visto, este é um caminho de sucesso… Garantido!
Depois ainda explicou que a Europa e as suas democracias vão prevalecer, e que Putin falhará. Uma vez mais, parece-me uma excelente abordagem; porém, fico meio baralhado com a inclusão da nouvelle democracia ucraniana.
Como sabemos, antes da invasão, a Ucrânia era um estado altamente corrupto, e naqueles rankings da limpeza aparecia ali bem pertinho da Rússia. Coloquemos os pontos nos iis: se, de repente, a Coreia do Sul invadisse a Coreia do Norte, não passaremos todos a dizer que uma democracia saudável foi invadida, certo?
Uma merda maior invadiu uma merda mais pequena, tudo certo. Mas, por favor, evitem o discurso do Bem contra o Mal, e, especialmente, não besuntem merda com aroma de rosa, porque o cheiro não muda.
A Rússia tem que perder esta guerra, e a Ucrânia, no cenário ideal, não deveria perder um metro de terra. Foi o que defendi na altura do Kosovo, Geórgia e qualquer outra anexação – não vou falar na mais antiga para não aborrecer os não-camaradas.
Portanto, mantenho a coerência. Agora, não pintem a Ucrânia como vales verdejantes cheios de Heidis, porque aquilo não é, e nunca foi, algo parecido com uma democracia saudável ou de padrões europeus.
Por fim, no seu discurso, Ursula, sabe-se lá porquê, ainda invocou a Elisabete II como exemplo maior dos valores europeus e da democracia. Aí já não dá Ursula… f$#@-se. Quem é que te escreve os discursos? Uma rainha que foi a zero eleições é um exemplo de democracia? Perdi alguma aula na escola e passei a História administrativamente, enquanto os conceitos eram alterados nos gabinetes?
Entretanto, Lagarde ouviu este discurso e puxou logo da calculadora para encontrar o próximo aumento da taxa de juro. Aguardo em pulgas…
Fiquei, contudo, na dúvida apenas em duas ou três coisitas, que talvez um de vós, mais estudado, me possa elucidar.
Quem nos pede tantos esforços, e discursa de forma épica, sentindo-se um Churchill de Bruges, por acaso também leva cortes salariais? Perde poder de compra? Paga prestações ao banco? Passa anos com o mesmo salário?
É que, se percebi bem, pode não ser o caso.
A Europa prepara-se para ajudar os seus cidadãos nas faturas da electricidade – julgo que virá um pacote para as rendas de casa e a própria Ursula, certamente imbuída de um espírito venezuelano, já disse que é altura de limitar os preços e taxar as petrolíferas pelos lucros extraordinários.
Portanto, vivemos uma fase de lucros desmesurado, jackpot de impostos, migalhas e esmolas para o povo e nada de aumentos salariais reais.
Assim sendo, julgo que estamos a prevalecer bem para vencer melhor. Por mim é continuar: também não tinha nada de especial planeado para os próximos cinco ano anos.
Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)
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