PANDEMIA EM LISBOA

Milhões gastos em ‘testes à discrição’ davam para quatro anos do Plano de Saúde Gratuito prometido por Moedas

por Pedro Almeida Vieira // Janeiro 22, 2022


Categoria: Exame

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O município de Lisboa tem decidido pagar testes de antigénio aos residentes e não-residentes da capital – que permite assim que qualquer pessoa possa, no limite, fazer 14 testes por mês –, através da contratação de uma empresa ligada à Associação Nacional de Farmácias. Em apenas dois contratos nos últimos nove meses, o município agora liderado por Carlos Moedas gastou 9 milhões de euros, mais do que todas as outras autarquias juntas gastaram para o mesmo fim. Na capital portuguesa vive 5% da população do país.


Desde Maio do ano passado, a Câmara Municipal de Lisboa gastou 9 milhões de euros no financiamento de testes de diagnóstico da covid-19, um montante que daria para quatro anos do Plano de Saúde Gratuito prometido por Carlos Moedas aos munícipes carenciados da capital com mais de 65 anos. Ainda sobraria um milhão para financiamento de um ano da Fábrica de Empresas, o hub criativo de startups anunciado pelo novo presidente da autarquia.

Este gasto foi, até agora, consubstanciado sobretudo em dois contratos, ambos assinados entre a Câmara de Lisboa e a Farminvest – uma empresa pertencente à Associação Nacional de Farmácias –, e que está na base da generalização dos testes gratuitos em farmácias da capital.

people inside yellow tram and others are standing near road during daytime
Estratégia de testagem massiva em Lisboa não encontra paralelo em outro qualquer município.

Os detalhes dos contratos com a Farminvest, sempre por ajuste directo – ou seja, sem qualquer concorrência nem avaliação de preços de mercado –, não estão ainda sequer no Portal BASE, mas a atender a outro contrato similar concretizado entre aquela empresa e o Instituto de Administração da Saúde da Madeira, cada teste de antigénio deverá ter custado 15 euros.

Este é, aliás, o valor máximo fixado numa portaria do secretário de Estado da Saúde, Diogo Serra Lopes, em 3 de Dezembro passado. O Estado português garante, em qualquer região, a comparticipação integral de quatro testes por mês a cada pessoa.

O primeiro contrato, assinado em 26 de Maio, ainda no tempo de Fernando Medina à frente dos destinos da edilidade lisboeta, a Farminveste recebeu 5.699.885 euros, para garantir testes gratuitos aos munícipes durante seis meses em farmácias aderentes.

Na quarta-feira passada, dia 19, foi concretizado um novo contrato, desta vez com o valor de 3.225.000 euros e uma duração de 120 dias, ou seja, até meados de Maio.

Em termos globais, significa que a Câmara Municipal de Lisboa gastará, nos 300 dias dos dois contratos, uma média diária de quase 30 mil euros.

Recorde-se que a Câmara Municipal de Lisboa decidiu reforçar a “comparticipação” – leia-se, pagamento integral – de testes rápidos de antigénio na rede de farmácias aderentes da Associação Nacional das Farmácias, para além dos quatro testes mensais suportados pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS). E alargou também esse “direito” aos não-residentes. Cada pessoa poderá fazer um teste a cada três dias, o que tem vindo a ser utilizado massivamente sobretudo por jovens na sexta-feira, com ajuntamentos à porta destes estabelecimentos. No limite, qualquer pessoa em Lisboa consegue assim fazer 14 testes de antigénio por mês.

Esta estratégia de testagem massiva em Lisboa é ímpar a nível nacional. Embora desde o início da pandemia se contabilizem dezenas de autarquias que optaram por reforçar a comparticipação do SNS, pagando testes à população, a edilidade da capital portuguesa tem-se esmerado e destacado, oferecendo testes “à discrição”.

Gastos totais e per capita nos 10 municípios com maior despesas em contratos de testes de diagnóstico da covid-19

Contabilizando todos os contratos para a realização de testes PCR e de antigénio (rápidos), incluindo compra de reagentes, constantes no Portal BASE, o PÁGINA UM apurou que 59 Câmaras Municipais gastaram já 16.486.928 euros, sendo que a autarquia de Lisboa foi responsável por quase 55% do total.

A autarquia de Cascais – que tem sido uma das que mais tem gastado na luta contra a covid-19 – pagou 1.925.730 euros em testes de diagnóstico à presença do SARS-CoV-2, enquanto a autarquia do Porto despendeu 1.032.400 euros. Em montantes menos elevados, acima dos 100.000 euros (mas inferiores a 400.000 euros) encontram-se mais 11 autarquias: Albufeira, Amadora, Oeiras, Loulé, Braga, Vila Nova de Gaia, Vizela, Guimarães, Vila Franca de Xira, Loures e Castelo Branco).

Em termos relativos, o gasto da autarquia alfacinha também se salienta em comparação com as demais autarquias, caso se se considere a população de cada concelho, de acordo com os recentes Censos do ano passado. Com efeito, no lote das 10 autarquias que mais gastaram em contratos para testagem desde o início da pandemia, a autarquia de Lisboa pagou 16,5 euros por cada um dos seus 545.923 munícipes, quase o dobro da segunda mais gastadora, Cascais (9,0 euros). O Porto despendeu, até agora, 4,5 euros por munícipe e Vila Nova de Gaia – o terceiro mais populoso concelho do país – nem chega ao um euro por munícipe (74 cêntimos).

Note-se que a autarquia de Sintra, a segunda do país com mais população, não consta da lista de adjudicante em contratos de testes, havendo apenas contratos feitos pelos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento destinados ao rastreio de funcionários.

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