Há muitos anos, um colega de turma perguntou ao professor:
– “Afinal, senhor professor, que diferença pode haver entre gerir uma empresa pública e uma privada?”
O professor fez uma pausa de segundos e contou:
– “Numa sexta-feira, ao final da tarde, o administrador financeiro de uma empresa pública entrou, preocupadíssimo, no gabinete do presidente do conselho de administração e disse-lhe:
“Senhor presidente, estamos perdidos. Os nossos dois maiores clientes declararam falência e, dado o montante das suas dívidas para connosco, é certo de que iremos falir por arrastamento.”
O presidente levantou-se, arranjou o nó da gravata, e começou a caminhar para a porta enquanto exclamava:
“Meu Deus! O que eu me vou preocupar na segunda-feira de manhã!”
Lembrei-me deste episódio quando ouvi a história da indemnização, de meio milhão de euros, dada pela TAP à sua ex-administradora exclusiva, Alexandra Reis, de cujos serviços terá prescindido (segundo alguns) ou aceitado a sua demissão (segundo outros), a meio do seu mandato de quatro anos.
Vejamos, então, como se gere uma empresa que depende do Estado.
A TAP, é sabido, é uma empresa que vive a balões de oxigénio, com o Estado a salvá-la, consecutivamente, da falência graças a injeções de capital na ordem dos milhares de milhões de euros.
O número de funcionários, e de aviões, reduz constantemente.
Enfrenta greves sucessivas dos funcionários que consideram não receber o salário que lhes é devido nem ter as condições de trabalho necessário para um desempenho eficaz.
O serviço da companhia – que já foi considerado dos melhores do mundo – degrada-se de dia para dia: os atrasos são constantes, o serviço de bordo é péssimo, os preços dos bilhetes, principalmente para alguns dos destinos com mais procura, por não terem concorrência, são de agiotagem.
Tudo isto só pode levar à conclusão de que a sua administração é de uma incompetência atroz.
O que não impede que os seus membros aufiram ordenados principescos, como aliás o próprio Presidente da República reconheceu (até porque lhe toca na pele): “é sempre o problema de haver uma série de cargos empresariais de empresas direta ou indiretamente relacionadas com o Estado ou propriedade do Estado, que são muito superiores àquilo que são os vencimentos, não digo dos portugueses, mas mesmo dos titulares do poder político ao mais alto nível”.
Na realidade, a senhora de quem vimos falando, recebia um salário duas vezes superior ao do Presidente da República…
É muito, há que reconhecer, mesmo não tendo em conta a falta de qualidade do seu trabalho, nem os resultados alcançados.
Se já era grave “premiar”, para mais com 500.000 euros, o despedimento (ou a saída de “motu próprio”) de uma funcionária cujo trabalho era medíocre (para ser simpático nesta época natalícia), o que se seguiu foi, ainda, mais incompreensível.
O mesmo “patrão” contratou a senhora para outra das suas empresas, mas promovendo-a a presidente.
Não conheço o salário que foi receber mas deve ter tido um “aumentozito”, em relação ao último, dada a promoção, o que possibilitou, certamente, que não tivesse de recorrer ao dinheiro da indemnização para poder pagar as contas do dia-a-dia.
Uns meses depois, todavia, também deixou esse cargo.
Não se sabe se por ter sido despedida, ou se por sua iniciativa, nem mesmo se recebeu outra indemnização.
Sabemos, somente, que foi contratada, para outro lugar e, de novo, pelo mesmo “patrão”.
Duvido que conseguisse o mesmo trajecto numa empresa privada, mas isso não é para aqui chamado…
É, agora, secretária de Estado do Tesouro.
Considero uma excelente escolha e aplaudo-a veementemente.
Espero bem que consiga aumentar o Tesouro Público na mesma proporção que consegue aumentar o seu. Privado.
Vamos ser a inveja da Europa!
Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso
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