O cofre terá sido inventado por Alejandro Fichet e era um lugar de guardar bens queridos por valor ou emoção. Em todas as casas, os cofres fizeram furor e deram origem a cenas de faca e alguidar até que os bancos se tornaram lugares credíveis onde estavam garantidos os depósitos dos cidadãos poupadores. Os cofres tornaram-se instituições.
Os mealheiros são outra coisa diferente; serviam para guardar pequenas poupanças disponíveis a qualquer momento. No século XVIII guardava-se muito dinheiro em potes de uma cerâmica tipo pygg e, por corruptela linguística, se confundiu com pig e assim desataram a surgir os mealheiros com formas de porco.
Um mealheiro não é um cofre! Uma carteira não é um alforge. Um cofre não pode ser uma churrasqueira, porque os bens lá guardados não se trituram, não servem para desbaratar. No entanto, à Rua dos Bacalhoeiros em Lisboa lá está a churrasqueira O Cofre que podia ser a sede nacional do Partido Socialista. Ali se faz bom churrasco.
Portugal é o Fort Knox dos avençados de um partido de poder. Lá na América é no Kentucky; aqui, fica situado ao Largo do Rato, em Lisboa, e ali se distribui emprego, se criam desnecessidades para catapultar existências e ali se produz o nepotismo mais medíocre.
Deve haver um curso em Forte Knox de como delapidar o dinheiro alheio, como destruir as poupanças dos portugueses, como subtrair em impostos o que os esforçados produzem e como entregar em migalhas aos mais necessitados, apenas o suficiente para que se perpetue a miséria.
Este Forte Knox onde a conversa mais usual é: “O que podes dar ao Luís? Ou: ”Tens por aí uma direcção de Hospital, ou uma instituição que dominamos”? Um lugar na Misericórdia? Na CP ou noutra instituição pública também serve. Na TAP? Na Banca? OK. Ele só fez a licenciatura, mas está pronto!
Terminada a conversa em Forte Knox, vai-se à churrasqueira O Cofre queimar mealheiros. Este é o país da mãozinha onde os portugueses confiaram as suas poupanças. Neste momento, pagam a maior quantia jamais vista de impostos directos, indirectos e taxas.
Também estamos perante a maior produção de obra pública de necessidade duvidosa jamais pensada, mesmo comparando com os tempos do cavaquismo betonado. Não estamos a fazer auto-estradas, nem a dizer que se está a construir a Torre Eiffel, nem uma nova Expo, mas estamos a sonhar com milhões de euros que vão ser entregues pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) sem a capacidade de vigilância pela oposição.
Um governo de esquerda, corajoso e sem mácula, colocava homens do André Ventura a percorrer os contratos e as obras do PRR – quem não deve não teme. Na churrasqueira O Cofre é importante tostar o Chega e as suas potenciais vantagens para o sistema.
O problema português está na oposição, que tem de pensar seriamente neste problema: o que leva o povo a iludir-se com o homo larapiens (feliz expressão do Dr. Cândido Ferreira em artigo recente)? O que impede a confiança na oposição? O que prejudica a imagem dos partidos na hora do voto?
Uma das razões é a não clara distanciação dos partidos aos seus militantes suspeitos de abuso do poder. Outra é a dificuldade em definir linhas que marcam lideranças sem demagogia e sem medo. Até lá o homo larapiens está em Forte Knox a cuidar dos mealheiros alheios e aforrar os cofres que tem em casa. Entretanto, brinda na churrasqueira O Cofre.
Diogo Cabrita é médico
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