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Farmacêuticas da covid-19 e gripe enchem cofres da Sociedade Portuguesa de Pneumologia

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por Pedro Almeida Vieira // Fevereiro 16, 2022


Categoria: Exame

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Desde o início da pandemia, e especialmente no ano passado, a Sociedade Portuguesa de Pneumologia não teve mãos a medir para receber dinheiro das farmacêuticas. Em 2021, ganhou, de forma directa, tanto como era normal em dois anos. E, no último biénio, os apoios da Pfizer cresceram 3.016% em comparação com o período homólogo anterior.


Em tempos de pandemia, desde o ano de 2020, a indústria farmacêutica reforçou os apoios financeiros à Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP), sendo perfeitamente identificáveis as empresas com interesses directos em fármacos associados à covid-19 ou à gripe.

De acordo com a análise do PÁGINA UM aos financiamentos da indústria farmacêutica no último quinquénio, através do Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed, os apoios da Pfizer – fabricante de vacinas contra a covid-19 e do antiviral Paxlovid – cresceram 3.106% nos dois últimos anos (2020-2021) face ao período 2018-2019.

Antes da pandemia, a farmacêutica norte-americana até tinha interesses na área da pneumologia – vendendo, por exemplo, a vacina pneumocócica – e apoiava as actividades da SPP, mas com verbas pequenas. Em 2017 concedeu 18.300 euros, no ano seguinte 6.000 euros, e em 2019 apenas 6.250 euros. Em 2020 ainda não se vislumbrou apoios de relevo, com o apoio a situar-se nos 12.000 euros.

Porém, no ano passado, a Pfizer fez um “esforço” nunca visto: 369.650 euros, sobretudo para pagar uma inédita campanha de sensibilização para a vacinação, mas não da covid-19; foi para a vacina pneumocócica, o que não deixa de ser estranho porque essa vacina em concreto é apenas recomendada para idosos e grupos de risco.

No entanto, também para o Congresso Nacional de Pneumologia, a Pfizer abriu os cordões à bolsa, dando um inédito apoio de 35.000 euros. Acresce a este montante, o pagamento de inscrições de 38 profissionais de saúde para este congresso que se realizou em Novembro passado, no valor de 14.820 euros, que acabaram nos cofres da SPP.

A portuguesa BIAL também reforçou bastante os apoios no último biénio à SPP. Embora não tenha qualquer fármaco associado directamente à covid-19, esta farmacêutica possui diversos medicamentos para doenças respiratórias, entre os quais o Clavamox, um antibiótico com aplicação para as bronquites e pneumonias, muito frequentes em estados subsequentes à infecção viral pelo SARS-CoV-2.

Se no triénio 2017-2019 os valores anuais da BIAL entregues à SPP se situaram entre os 13.530 e os 84.300 euros, nos últimos dois anos chegaram aos seis dígitos: 119.160 euros em 2020, e 166.751 euros, no ano passado. Além de apoios financeiros em congressos e outros eventos, a BIAL financiou webinares, tendo mesmo prometido em Março de 2020 criar “um fundo, com uma dotação de meio milhão de euros para as apoiar as diversas iniciativas da comunidade no âmbito do combate à pandemia covid-19”. A empresa portuguesa é agora a terceira mais generosa para a SPP no último quinquénio.

Quem também foi bastante generosa com a SPP foi a Sanofi. Apesar do “desaparecimento” da gripe, a Sanofi viu subir o seu negócio de venda das vacinas anti-gripais em Portugal, beneficiando de recomendações, por exemplo, do presidente da SPP, António Morais, e do pneumologista Filipe Froes.

Apoios do sector farmacêutico (em euros) à Sociedade Portuguesa de Pneumologia entre 2017 e 2021. Fonte: Infarmed.

António Morais chegou mesmo a dizer ao Observador que a vacina da gripe “estimulava a resposta imunitária geral”, sugerindo que até poderia trazer benefícios em caso de infecção pelo SARS-CoV-2. Froes ainda foi mais taxativo: por exemplo, em Junho do ano passado, este conhecido pneumologista com ligações fortes às farmacêuticas, defendia que “a reserva das vacinas da gripe tem que ser feita [em Portugal] com a máxima antecedência de maneira a garantir um número de vacinas que, cada vez mais, é escasso perante as solicitações dos outros países”: Resultado: a DGS comprou mais vacinas contra a gripe.

A Sanofi, que já aumentara substancialmente os apoios à SPP em 2020 (com um total de 58.889 euros) face aos anos anteriores à pandemia, ainda abriu mais a carteira no ano passado: 153.585 euros.

A AstraZeneca também mostrou maior interesse em apoiar ainda mais a SPP, sobretudo durante o ano de 2020, quando então estava tão bem colocada como a Pfizer para a venda de vacinas contra a covid-19. No primeiro ano da pandemia concedeu apoios na ordem dos 108.900 euros, valor que desceu para os 50.750 euros em 2021.

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Note-se, contudo, que alguns importantes eventos da SPP financiados pelas farmacêuticas acabam remetidos para o ano seguinte nos registos da Plataforma da Transparência e Publicidade do Infarmed, como sucede com grande parte dos apoios dos congressos de pneumologia que, por regra, se realizam em meados de Novembro.

Curiosamente, a Gilead – que beneficiou de um contrato de 20 milhões de euros para a venda do antiviral remdesivir, e que teve Filipe Froes como consultor – não despendeu muito dinheiro com a SPP: apenas 17.500 euros nos últimos dois anos. Contudo, antes dessa data não lhe tinha concedido qualquer verba.

Outras empresas não directamente relacionadas com a covid-19 acabaram também por fazer fluir mais dinheiro do que o habitual para a SPP, entre as quais a Boehringer Ingelheim.

Com fortes interesses na venda de fármacos para tratamento de fibrose pulmonar e doença pulmonar obstrutiva crónica, esta farmacêutica alemã ainda é aquela que concedeu maiores apoios à SPP no último quinquénio (524.668 euros), mas ficou apenas em terceiro lugar no último biénio (269.600 euros), atrás da Pfizer e BIAL.

A Novartis – que foi a segunda farmacêutica com mais dinheiro entregue à SPP durante o último quinquénio – “desinvestiu”, tendo reduzido os apoios na ordem dos 25% no último biénio em comparação com o anterior. O mesmo sucedeu com a GlaxoSmithKline, a A. Menarini e a Roche, que também diminuíram os seus apoios, em alguns casos de forma significativa, o que também é demonstrativo do mecanismo de financiamento das sociedades médicas. Ou seja, o sector farmacêutico dá agora mais ou menos em função das suas receitas e/ou dos benefícios potenciais no presente e no futuro.

Refira-se que o PÁGINA UM contactou todas estas farmacêuticas e a SPP durante a preparação desta investigação jornalística, mas nenhuma concedeu informações nem respondeu às questões colocadas.

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