Estátua da Liberdade

A Bancarroteira Nacional e o “bem comum”

Statue of Liberty in New York City under blue and white skies

por Luís Gomes // Março 22, 2023


Categoria: Opinião

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Em resposta ao meu artigo, o meu companheiro Tiago, aqui do PÁGINA UM, voltou à carga metendo a Bancarroteira Nacional, e desta vez, tal como Pedro Nuno Santos, com a estafada divisa: “a TAP é nossa”, mesmo daqueles que não a usam! Nunca dei por tal, sempre que viajei na TAP ou em outras companhias aéreas em que paguei o respectivo bilhete de avião.

No referido artigo, para justificar o assalto do contribuinte português, o tal que aufere 971 Euros líquidos por mês e que paga uma fracção assinalável dos salários da Bancarroteira Nacional, o Tiago até recorreu a contradições insanáveis.

Senão vejamos: “Mas noto que enquanto o Luís faz as contas, e bem, ao que o sr. João do Táxi ou a sra. Joana do Cabeleireiro pagam, já se esquece da calculadora na altura de referir os salários dos trabalhadores da TAP. Repare-se: se os salários são mais elevados, significa que também pagam mais impostos para o sr. João do Táxi. E ainda bem. É assim que funciona uma sociedade civilizada.”

Eu não me esqueci da calculadora, Tiago: sem o confisco dos desgraçados 1.300 euros brutos por mês, tal como o negócio da Sr. Joana ou do Sr. João que fecha portas caso as receitas sejam insuficientes para cobrir custos, a Bancarroteira Nacional também teria tido um fim, uma realidade que teimas em ocultar. Se esta sobrevive apenas do saque aos contribuintes, é a Sr. Joana e o Sr. João que pagam os salários da Bancarroteira Nacional, e não o contrário.

Sobre a “civilidade” dos impostos progressivos, é óbvio que um assaltante prefere sempre obter o butim num bairro de ricos. Aliás, há anos que a Mariana Mortágua chamava a nossa atenção para tal técnica de extorsão: “A primeira coisa que acho que temos de fazer é perder a vergonha de ir buscar dinheiro a quem está a acumular dinheiro“.

Agora compreendo o Tiago ler histórias de Nárnia, pois parece não compreender que os recursos no mundo real são escassos: os 3,2 mil milhões de euros necessários ao resgate da Bancarroteira Nacional foram subtraídos a milhares de pequenos negócios (IRS, IVA, IRC, SS…) que podiam ser aplicados na abertura de novas empresas e na contratação de pessoas.

white airplane wing over the clouds during daytime

Os milhares de desempregados da TAP e os seus fornecedores é o que se vê; o que não se vê, o mundo real, são os 320 euros retirados a cada português que podiam servir outros propósitos, mas foram usados para resgatar da falência um negócio ruinoso.

Em relação à “superioridade moral” que exibe, em particular o “argumento de paga quem usa é o típico de quem defende uma sociedade não solidária”, ajuda-me a compreender o seu fascínio pela eugenista Suécia.

Trata-se de um país protestante, cultura que deu origem a todas as ideologias totalitárias, como o socialismo, o comunismo, o fascismo e o nazismo. Julgo que o Tiago se encontra entre as duas primeiras.

Enquanto no mundo escolástico e dos direitos naturais (direito à vida, direito ao fruto do trabalho, direito à liberdade) e que deu origem ao liberalismo, a verdade significa que o que está dentro das nossas cabeças (ideias, noções, percepções) corresponde ao que está fora (a própria realidade); para qualquer ideólogo como o Tiago, é o contrário: é ter a própria realidade condizente com o que está dentro da sua cabeça.

black and gray airplane seats

Em vez de testar sua percepção contra a realidade, o Tiago julga a realidade contra a sua ideologia; ao lidar com qualquer fenómeno social, parte da premissa de que a “verdade” – ou seja, a sua ideologia – deve ser o parâmetro.

As ideologias são sempre perigosas: os homens “são todos iguais” (comunismo e social-democracia) ou o melhor governará as massas (fascismo e nazismo). Todos os homens têm seu lugar e devem chegar lá para que as coisas funcionem como prescreve a realidade ideológica, sempre a mais verdadeira, mesmo que o “lugar certo” de algumas pessoas seja o Gulag, Auschwitz, o campo de quarentena covid-19 ou a cadeia para os que se recusam a serem assaltados pelo Estado.

Normalmente, afirmam que este ou aquele mal seria “resolvido” se apenas todos, por exemplo, “entregássemos”, sem “qualquer resistência”, uma fracção expressiva do fruto do nosso trabalho ao Estado; a grandiloquente expressão “isso só é possível se todos pagarmos para o bem comum” do Tiago é a receita para todos os males.

O principal problema do pensamento ideológico é que se trata da adoração de uma fantasia. Fantasias são coisas que abundam na cabeça do Tiago, quando até atribui alma à “sociedade”: aparentemente, esta pensa, reflecte e actua!

white, red, and green airliner

A realidade, todavia, é muito diferente: existem indivíduos com fins e interesses distintos do seu. Eu, por exemplo, não estou interessado em pagar os desmandos da TAP. Se o Tiago quer viajar num avião onde lhe é servido um pastel de nata, enquanto escuta um fado, apenas tem de esperar umas horas e ter um pouco de paciência até chegar a Lisboa – vai ver que não custa nada –, ou então fundar uma companhia aérea com o seu bolso e pintar os aviões com as cores nacionais.

No pensamento colectivista do Tiago, o indivíduo existe para o bem da “sociedade” e não o contrário. O indivíduo tem de se subordinar e comportar-se em benefício da “sociedade”, sacrificando os seus interesses privados egoístas pelo “bem comum” – ninguém sabe o que é isto, mas o Tiago talvez nos explique.

Esta mentalidade colectivista foi essencial para a implementação do comunismo, do fascismo e o do nacional-socialismo: “O bem comum antes do interesse individual” proclamava Adolf Hitler nos anos 30 do século transacto.

Não é uma demonstração de compaixão sacrificar os nossos interesses pessoais pelo bem maior de nossa “sociedade”? O colectivismo, ao afirmar que o indivíduo deve sacrificar seus interesses privados pelo bem da “sociedade”, toma o que é meramente uma abstração – “sociedade” – e trata-a como se tivesse uma existência concreta; no fundo, um animismo próprio de sociedades tribais.

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Em contraste com o indivíduo, que tem uma existência real no mundo, a “sociedade” é uma abstração usada para representar uma colecção de indivíduos que interagem e buscam objectivos distintos para si.

Por mais que se perscrute, nunca se encontrará uma entidade concreta chamada “sociedade” que possamos apontar e identificar da maneira análoga à identificação de um indivíduo. A “sociedade” não existe separada dos pensamentos e acções das pessoas. Não tem interesses e não visa nada. O mesmo é válido para todos os outros colectivos, seja o proletariado, a nação ou os trabalhadores da TAP.

Como a “sociedade” não é mais que uma abstracção, pois não pode pensar, agir, falar ou escolher e, portanto, apenas um indivíduo – o Tiago –, ou um grupo de indivíduos – o Tiago e camaradas do ideário – deve ter a capacidade de definir o chamado bem maior da sociedade e, de seguida, o poder de forçar os indivíduos a agir a serviço desse “bem comum” – usam sempre o poder coercivo do Estado para a implementação das suas fantasias.

Desde o alvorecer da civilização que os indivíduos dominantes se autodenominam árbitros do bem maior, o que parece ser uma aspiração do Tiago, e, portanto, não surpreendentemente, o bem maior, na maioria das vezes, apenas equivale ao bem daqueles que estão no poder – o Tiago não está lá, mas parece que almeja.

pink and black ceramic piggy bank

Com tais ideias colectivistas, o indivíduo sempre foi uma vítima, comandado a ser “altruísta” no serviço sacrificial a algo superior, seja Deus, Faraó, Imperador, Rei, Estado, raça, proletariado, “sociedade” ou “trabalhadores da Bancarroteira Nacional”. É um estranho paradoxo que a ideologia do Tiago – que nos diz que devemos considerar-nos animais de sacrifício – tenha sido geralmente aceite como uma ideologia que representa a benevolência, o amor pela humanidade ou mesmo a “sociedade civilizada”, como parece ser a Suécia do Tiago.

Desde o primeiro indivíduo que foi sacrificado num altar para o bem da tribo, aos hereges e dissidentes queimados na fogueira pela glória de Deus, aos milhões exterminados em campos de concentração para o bem da raça (Auschwitz) ou do proletariado (Gulag), aos confinados para salvar-nos do vírus invisível, é essa a moral colectivista que justificou todas as ditaduras e todas as atrocidades, passadas e presentes, incluindo o assalto da Bancarroteira Nacional ao nosso bolso ocorrido em 2020 e 2021.

Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário


N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

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