Porque há uma enorme insensibilidade crítica na esquerda alcoólica e fumadora contra os direitos dos outros? Fumar e beber, mesmo que em excesso, é uma habilidade social, um escape de todos os que entendem aquelas imagens do intelectual excessivo, do poeta enevoado, do escritor tombando no regresso a casa.
Esta ideia da bebedeira premiada de Cultura encobre e “justifica” muitos casos de violência sobre as mulheres, muitos acidentes de viação, e muitas causas de doença.
Já o nevoeiro interno e externo, todas as lutas para o direito de fumar, encobrem a brutalidade das patologias que lhe estão associadas e todos pagamos no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Fumam porque são direitos individuais e direitos de liberdade. As consequências nunca importam.
Já a presença do jogo livre, em casinos e em Santas Casas de enriquecer com a miséria alheia, é outra coisa muito aceite pela esquerda e pela tolerância actual das lideranças do Mundo.
Também a completa democracia do açúcar é considerada uma coisa intocável, sendo hoje a maior causa de doença da juventude. O uso de telemóvel nas estradas é outra fantástica causa de acidentes e mortalidade nos condutores mais novos. Não se criam aplicações nem métodos de impedir o seu funcionamento dentro de automóveis, se calhar porque não se quer.
Porque vem um tipo com os dedos amarelos da nicotina, de copo de whisky na mão gritar contra a liberdade da prostituição protegida pela lei?
Porque não somos a favor da máxima liberdade sujeita a códigos de boa convivência?
A construção de regras e de limites permite definir as condutas e os gestos em tecido social.
Detesto que ouçam teleparvoíces nos lugares públicos. Detesto ouvir as conversas alheias à porta da consulta e no bar do Hotel. Teremos de regrar esta poluição sonora trazida pela tecnologia que hoje é o novo tabaco dos aviões, das salas de espera, dos restaurantes. Os cidadãos têm mecanismos de nos poupar aos seus sons – usem-nos.
O som espalhado pelas Câmaras Municipais nas cidades. O tonto que vai para a floresta ouvir rock aos berros, o estúpido que nos impede de escutar o vento e os pássaros ao pôr do Sol. Mas há uma lista de coisas que sim e outra que não, mesmo que o contraditório não se coloque. O que importa são as minhas certezas e as minhas convicções.
Não, não tendes razão. A prostituição de seja quem for, deve ser livre e protegida, e pagar impostos e permitir a reforma. Sim, o trabalho de casa pode e deve ter algum valor que permita a mulher, mãe e dona de casa defender-se num divórcio com um abusador. Sim, o alcoolismo deve ser causa favorável de divórcio e protecção de menores. Sim, o tabaco é uma droga e deve ter as mesmas opções terapêuticas que as outras dependências. Sim, o tabaco é causa de absentismo laboral e de menor trabalho em muitas circunstâncias.
Dito tudo isto, defenderei sempre o direito de fumar, o direito de beber, o direito de estar ao telemóvel, o direito de dares umas voltas cobrando o teu corpo, mas sempre no respeito da existência do outro. O outro está antes do teu egoísmo, é isso? – é boa educação.
Diogo Cabrita é médico
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.