Ainda é tudo muito recente, mas Rabo de Peixe (ou Turn of the tide, em inglês) fez disparar a notoriedade da vila situada na ilha de São Miguel, nos Açores. O sucesso da série da Netflix colocou a vila piscatória, mais conhecida pela sua pobreza, debaixo dos holofotes mediáticos tanto na imprensa nacional como internacional. A onda de publicidade em torno da região fez nascer perspectivas de atracção de mais turistas e investidores, nomeadamente para o mercado imobiliário. Por agora, os efeitos não são ainda visíveis. Mas as expectativas, agora que se anunciou a segunda temporada, são grandes, aproveitando o estrelato mediático da região. Talvez Rabo de Peixe se venha a tornar tão icónico como qualquer um dos 12 antigos cenários de filmes que o PÁGINA UM recorda.
Ainda não deu à costa, mas o mercado imobiliário na vila de Rabo de Peixe, nos Açores, agora famosa internacionalmente devido à série portuguesa que faz sensação na plataforma Netflix, espera uma mudança de maré, e que seja alta.
Para já, à tona há muitas expectativas e a esperança de um aumento na procura turística e também na venda de imóveis nesta vila piscatória de São Miguel, uma das mais pobres do país. Em 2015 era a freguesia portuguesa com mais pessoas a receber Rendimento Social de Inserção (RSI).
O sucesso da série “Rabo de Peixe” (Turn of the tide, em inglês) não é apenas nacional. A cobertura mediática também tem sido internacional, por via das boas classificações em sites da especialidade.
Com os holofotes colocados na freguesia onde residem cerca de 8.800 habitantes, é natural que as expectativas de que a série possa atrair turistas e investidores para a ilha seja vista como natural.
Para já, na procura turística por alojamento local, mantém-se a situação prévia à estreia da série. O Verão está lotado em praticamente todos os alojamentos contactados pelo PÁGINA UM na plataforma Airbnb, mas não é nada surpreendente: a esmagadora maioria das reservas já estavam asseguradas antes mesmo do lançamento da série. Para o Outono, ainda há muitos alojamentos disponíveis, mas os preços rondam os valores praticados em Lisboa.
Em termos do mercado imobiliário, a situação é ainda de normalidade. “A procura [por casas] tem sido relativamente a mesma, não houve um pico acentuado”, diz João Lima, agente imobiliário da Remax naquela vila piscatória, que alberga o maior porto de pesca da ilha de São Miguel.
Também uma porta-voz na imobiliária ERA apontou ao PÁGINA UM no mesmo sentido: “não temos dados, de momento, que sustentem uma maior procura de casas nos Açores que possamos atribuir à série da Netflix”.
Mas há muitas expectativas.
“De momento, está tudo dentro da normalidade, mas ainda é muito recente, e acredito que nos próximos meses a série irá contribuir para uma maior procura, não só em Rabo de Peixe, mas na Ilha de São Miguel”, lançou João Lima.
De facto, a procissão ainda vai no adro. A série estreou há cerca de um mês, 26 de Maio, tem sido a mais vista na Netflix em Portugal. A nível mundial, chegou ao Top 10 do ranking de visualizações da plataforma de streaming, atingindo a sétima posição das séries mais vistas em língua não-inglesa. Além disso, atingiu o Top 10 em 15 países de quatro continentes.
A promoção internacional do nome da pequena vila enfrenta, porém, uma corrente que tem levado a um arrefecimento do mercado imobiliário a nível nacional.
O mercado ainda continua “quente”, com os preços em níveis historicamente elevados, mas tem-se observado um abrandamento, tanto na subida dos preços, como no número de casas vendidas e créditos à habitação concedidos.
Na avaliação que os bancos fazem das casas no âmbito da concessão de crédito à habitação, registou-se em Abril uma queda de 34,3% no número de avaliações efectuadas, comparando com o mesmo mês do ano passado, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE).
O valor mediano de avaliação bancária na habitação subiu oito euros face a Março, para o valor mais alto desde pelo menos 2011: nos 1.491 euros por metro quadrado. O aumento em média mensal foi de 0,5% enquanto a subida homóloga foi de 10%, a mais baixa do último ano. Foi na região autónoma dos Açores que se registou a menor subida homóloga: 1,9%.
De facto, ainda segundo o INE, os preços das casas desaceleraram nos primeiros três meses deste ano, com o índice de preços na habitação a aumentar 8,7% em termos homólogos, 2,6 pontos percentuais abaixo do registado no trimestre anterior.
A venda de casas sofreu uma queda trimestral de 16% e, em termos homólogos, a descida chegou aos 20,8%. Nos Açores, a queda na venda de casas foi de 23% no primeiro trimestre de 17% em comparação com igual período de 2022. Em todo o arquipélago, no primeiro trimestre, foram vendidas 599 casas num montante de 87 milhões de euros. Estes valores representam, respectivamente, 1,7% e 1,3% das vendas efectuadas em todo o país.
Actualmente, na plataforma de promoção de imóveis Idealista, surgem à venda 44 casas em Rabo de Peixe. O preço médio em todo o concelho da Ribeira Grande ascende aos 1.031 euros por metro quadrado, o que representa um aumento de 13% face ao valor registado há um ano na mesma plataforma. Em Lisboa, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE) o valor médio das casas era de 3.872 euros por metro quadrado, no final de 2022.
Série no topo
Criada pelo açoreano Augusto Fraga, Rabo de Peixe foi rodada em diversos locais, incluindo na freguesia que dá o nome à série.
O enredo baseia-se num caso real que remonta a 2001, quando deram à costa daquela vila piscatória fardos de cocaína, na sequência de um naufrágio de uma embarcação que se dirigia para Espanha transportando meia tonelada daquele estupefaciente.
Produzida pela Ukbar Filmes, a série, além de ser líder em visualizações na Netflix em Portugal, Rabo de Peixe chegou a série mais vista em muitos outros países. A plataforma anunciou, entretanto, que vai haver segunda temporada.
Também tem recebido excelentes classificações, nomeadamente no site IMDb, onde tem um rating de 7,7 em 10. No Rotten Tomatoes, a série portuguesa cativou uma classificação de 4.5 em 5. A crítica do PÁGINA UM pode ser lida aqui.
Com tão boa recepção e impacto mediático, e com segunda temporada à vista, antecipam-se possíveis mudanças na região, tanto em termos turísticos como ao nível da atracção de investidores. E a bela vila, outrora conhecida como uma das zonas mais pobres da Europa, ganhou agora uma fama mais glamorosa. Como num conto de fadas, a “abóbora” transformou-se numa linda carruagem. A expectativa é que a maré traga mais visitantes (e dinheiro) à (naturalmente) bela região.