Canal de TV promoveu "jovem milionário português" com vida de luxo

Federação das Associações da Cripto-Economia lança alerta sobre reportagem da TVI

por Elisabete Tavares // Junho 26, 2023


Categoria: Imprensa

Temas: Economia, Media

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Profissionais do sector da economia baseada na tecnologia blockchain criticam e demarcam-se da reportagem emitida pela TVI na quarta-feira passada sobre um alegado jovem português milionário, Renato Duarte Júnior, apresentado como CEO de uma empresa de investimentos. A Federação das Associações de Cripto-Economia critica a reportagem, bem como a “imagem errada” de enriquecimento fácil e rápido dada, e teme que leve investidores ao engano. O “jovem milionário” é um desconhecido na comunidade de criptomoedas portuguesa e a sua empresa nem consta da lista de entidades de criptoactivos autorizadas pelo Banco de Portugal a operar no país.


Uma reportagem da TVI sobre um “jovem milionário português” está a gerar uma forte onda de críticas sobre a estação de televisão por parte da comunidade de profissionais do sector das criptomoedas e criptoactivos em Portugal.

A Federação das Associações de Cripto-Economia (FACE) alerta que o conteúdo da reportagem e a “imagem errada” transmitida de enriquecimento fácil e rápido, através de um suposto investimento em activos digitais, pode levar investidores ao engano.

Para Nuno Lima Luz, presidente da Associação Portuguesa de Blockchain e Criptomoedas (APBC) – que integra a FACE –, a ideia passada pela reportagem “é perniciosa”. “Ficámos surpreendidos com a reportagem que passou em horário nobre. Na comunidade, todos nos manifestamos contra as ideias transmitidas pela reportagem, as quais não representam o sector”, disse ao PÁGINA UM. “Estranhamos este tipo de reportagem que promove este tipo de actividades em horário nobre”, afirmou. Acrescentou que a FACE está a preparar um comunicado à imprensa com críticas e alertas sobre a reportagem.

Na reportagem “Repórter TVI: Júnior, o milionário improvável”, o canal de TV entrevista o português Renato Júnior, de 29 anos, que aparenta viver uma vida de luxo no Dubai, sendo apresentado como presidente-executivo (CEO) da empresa dbl.pt. Ao longo da reportagem, são feitas diversas entrevistas em iates e mostrados cenários compatíveis com uma vida de luxo.

A reportagem, que está disponível na plataforma na TVI, é acompanhada de um pequeno texto de resumo onde se pode ler: “Tem 29 anos e é um exemplo de quem conseguiu singrar no mercado da moeda virtual. Deixou a escola para trás e aos 17 anos emigrou para o Canadá, onde foi trabalhar nas obras”.

O texto da promoção da reportagem prossegue: “Com o dinheiro que amealhou investiu num computador e num telemóvel e esta foi a porta de entrada para o mundo do dinheiro digital.”

Segundo a reportagem, Renato Júnior “começou com um investimento de 100 euros” e “atualmente, vive no Dubai e é de lá que gere um negócio de milhões”.

O empresário e investidor apresenta-se assim: “Eu sou o Júnior. Venho de uma família humilde e aos 17 anos emigrei para o Canadá. Trabalhei na construção, mas sempre assumi que um dia ia fazer muito dinheiro.”

A comunidade portuguesa de cripto-economia desconhece quem é Renato Júnior. Na reportagem, o único rosto familiar no sector em Portugal é o de Fred Antunes, CEO da RealFevr e ex-presidente da APBC, o qual foi entrevistado pela TVI para a reportagem, e que prestou comentários gerais sobre o sector.

Consultado o site do Banco de Portugal, verifica-se que a empresa dbl.pt não consta da lista de 10 entidades que estão actualmente autorizadas pelo regulador para intermediar investimentos em criptomoedas e activos digitais no país.

Pesquisando na Internet, encontra-se um site de uma empresa com o endereço dbl.pt, o qual não dispõe de contactos nem de informação sobre a sociedade, os seus proprietários ou gestores. Ao entrar na página, é mostrado um aviso relativo a phishing e é pedido ao utilizador que verifique sempre se está a usar o endereço dbl.pt.

Na área de respostas a perguntas frequentes, a dbl.pt refere que tem dois tipos de produtos: um promovido como sendo “seguro”, estando o investimento alegadamente garantido e com promessa de lucros até 40%; e no segundo produto o capital investido já não é garantido, embora sejam prometidos lucros que, diz-se no site, podem ir até os 1.894%. Neste caso, no reverso da medalha, há a possibilidade de o investimento se perder na totalidade.

O PÁGINA UM encontrou um outro site digitando www.dbl.pt, mas aqui surge uma mensagem de erro “503 – serviço temporariamente indisponível”.

Ainda não foi possível obter um comentário de Renato Júnior ou da dbl.pt, nem da TVI.


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