Correio Trivial

A diferença entre medo e terror

black and white abstract painting

por Vítor Ilharco // Novembro 11, 2023


Categoria: Opinião

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Foi uma semana de loucos.

Marcelo de Rebelo de Sousa, incomodado por ter sido acusado de meter uma cunha, a pedido de uma sua nora, para que o Serviço Nacional de Saúde pagasse medicamentos no valor de quatro milhões de euros a duas crianças estrangeiras, ainda mais com os médicos a garantir que aqueles não ofereciam qualquer garantia de sucesso no tratamento de que necessitavam.

Depois, soube-se que durante uma visita ao Bazar Diplomático, no Centro de Congressos de Lisboa, e na presença de uma dezena de jornalistas que tudo gravaram, Marcelo Rebelo de Sousa disse ao chefe da missão diplomática da Palestina, em Portugal, que alguns palestinianos não deviam ter começado esta guerra com Israel e aconselhou-os a serem moderados e pacíficos.

Após o que se seguiu uma troca de palavras que teve muito de bazar e pouco, ou nada, de diplomático.

Marcelo, é sabido, não leva desaforos para casa e diz o que lhe vai à cabeça independentemente de quem o contesta e do local em que o faz. Como bem ficou a saber o Embaixador da Palestina que nem teve que esperar para ser recebido no recato do Palácio de Belém, talvez com a presença do Ministro dos Negócios Estrangeiros, para ouvir das boas do Presidente da República.

Perante as reacções, e as promessas de ajuntamento de protesto em frente ao Palácio de Belém, Marcelo resolveu ir para a rua afim de se manifestar contra si próprio. Mais, foi o primeiro a chegar, tecendo fortes críticas aos seus contestatários pela falta de pontualidade.

Depois, teve a oportunidade de discutir com todos eles, um a um, e ainda o cuidado de, passados uns minutos, tirar o palito da boca não fosse o caso de qualquer um dos mal educados que por ali se manifestavam lhe acertar com os dedos que apontavam a poucos centímetros da sua cara.

No dia seguinte, Marcelo justificou-se:

“Nem percebo o alarido, não percebo. Foi o embaixador da Palestina que levantou a questão, não fui eu. Ele é que disse que a situação era muito complicada e deu as suas razões. No meu comentário, eu disse: atenção, é muito importante a moderação. E depois disse que foi pena que este caso tivesse nascido de um determinado lado.”

Aos amigos mais próximos, terá dito:

“O gajo é que começou e eu ficava-me?”

E foi dar uma volta no primeiro automóvel que circulou em Portugal no longínquo ano de 1895.

Em viaturas mais recentes, uma quantidade de Procuradores do Ministério Público, e agentes da Polícia Judiciária, deslocaram-se para fazerem umas buscas a residências particulares e oficiais, incluindo a do Primeiro-Ministro.

Ao que consta a razão principal tem a ver com os negócios do lítio, do hidrogénio e de um data center, e poucos portugueses ficaram surpreendidos.

Era mais que previsível que, mais dia menos dia, isso iria acontecer.

Não houve um português que tivesse ficado surpreendido.

Quem conhece o funcionamento da Justiça sabe que tudo se desenrolaria depois da “investigação” terminar.

O que, em português, quer dizer: “Depois de todas as escutas telefónicas terem sido ouvidas:”

Para se fazer uma acusação, no nosso país, basta isso.

Os portugueses, ao telefone, e nas redes sociais, contam toda a sua vida, convictos de que uma chamada telefónica é uma conversa “a dois”.

Ou que bastará usar um código primário para possíveis investigadores ficarem baralhados.

Dizem: “Tábem, eu desenrasco isso mas tens que me depositar vinte lençóis dos maiores na minha conta. Depois mando o nib.” e ficam convictos de que os magistrados aceitarão que se referiam a roupa de cama e não a notas.

Não é que eu considere os nossos juízes e procuradores gente de inteligência superior, mas há que reconhecer que, até eles, perceberão que algo não bate certo nesta conversa.

Concluídas as buscas, ficaram cinco pessoas detidas, duas delas muito ligadas ao Primeiro-Ministro, e ele próprio, para além do ministro que ele tanto tem apoiado (João Galamba), ficou ligado ao Processo.

O que levou a que António Costa tivesse pedido a sua demissão.

Aqui chegados, começam os portugueses a temer o pior.

Gente com medo do futuro próximo atendendo aos putativos candidatos ao lugar de líder do Governo.

Imaginar que o Partido Socialista avance, por exemplo, com o nome de Medina faz suor frio ao mais corajoso.

Pensar na hipótese de, perante estes dois anos de autoflagelação dos dirigentes do PS, a recolha cair em Luís Montenegro dá medo.

Admitir a hipótese deste se coligar a André Ventura aumenta esse medo e a vontade de seguir o conselho de Passos Coelho e emigrarmos.

Mas o terror, o verdadeiro terror, é sabermos que quem está a gerir esta situação complicada é Marcelo Rebelo de Sousa.

Não creio que ele tenha mais capacidade nas opções políticas do que na escolha das suas bebidas e, ele mesmo confessa, chega a desmaiar por beber um moscatel quente depois de um Fortimel…

Por mim falo: estou em pânico!

Vítor Ilharco é assessor


N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

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