Como a maioria dos portugueses, fiquei surpreendido ao saber do número de oficiais generais das nossas Forças Armadas.
Nada mais, nada menos do que 253.
Comecei por perguntar, a mim próprio, o que fariam todos estes militares no seu “dia de trabalho”.
Imaginei essas duas centenas e meia de criaturas a levantarem-se cedo, como é exigido a qualquer militar, tomarem o seu banho, fazerem a barba ou maquilharem-se, consoante o sexo, e saírem de casa, depois do pequeno almoço, pelas 8,30 da manhã.
Mas, com que destino?
Há mais generais no nosso Exército do que quartéis, e outras instalações da Força, em todo o país.
Há mais generais na Força Aérea do que aviões, helicópteros, avionetas e outros aparelhos voadores.
Há mais almirantes do que navios, submarinos, corvetas e cacilheiros.
E têm cerca de 20.000 militares sob as suas ordens.
O que farão, então, estes cidadãos?
Sei que alguns são colocados na Guarda Nacional Republicana, outros ocupam cargos de assessoria, outros fazem comentários nas televisões.
No concreto, todavia, o que fará a maioria deles?
Para se perceber o ridículo destes números podemos, e devemos, compará-los com os de outros países.
Vejamos:
As Forças Armadas dos Estados Unidos têm 1,3 milhão de soldados, 13.300 aeronaves, 303.553 veículos blindados de combate e 484 embarcações, com um orçamento anual de 760 bilhões de dólares e… 31 generais!
A nossa vizinha Espanha tem 120 mil militares no activo, e 345.486 na reserva, e 28 generais.
A França dispõe de 215.000 militares, entre os quais 55 generais.
A Alemanha conta com 183.730 militares incluindo 189 generais.
O Brasil tem 235.000 militares e 100 generais.
Ou seja, Portugal tem mais generais do que Estados Unidos, Espanha, França e Brasil, juntos!
Os 20.000 elementos das nossas Forças Armadas seriam, em qualquer daqueles países, comandados por um major. Ou um coronel.
Neste nosso cantinho, onde há menos praças do que graduados, se contarmos com sargentos e todo o tipo de oficiais não generais, algo tem de ser feito para mudar esta situação.
Em primeiro lugar há que saber quais os verdadeiros objectivos que os nossos governantes pretendem alcançar com as nossas Forças Armadas.
Militares para “garantirem a defesa da nossa soberania” contra um qualquer eventual ataque de outro país?
Se for esse o caso, então podemos temer o pior.
A Espanha, por exemplo, se pretendesse tal (e obviamente não quer, a não ser que os seus dirigentes enlouqueçam…) bastaria mandar um pelotão, comandado por um sargento, e em 24 horas teríamos de começar a falar castelhano.
Papel preponderante que os nossos militares podiam ter seria, por exemplo, a defesa das nossas costas marítimas, quer no impedimento de pesca ilegal quer impossibilitando que, por essa via, entrem em Portugal produtos ilegais ou gente indesejável.
Só que, para estas acções, precisamos de operacionais em forma física e bem treinados, não de generais idosos e bem nutridos, e aquele é o tipo de gente em falta nos quartéis.
Desde logo porque a juventude, na sua imensa maioria, nem quer ouvir falar de “tropa”.
Disciplina, regras apertadas, levantar cedo, obedecer cegamente, péssimos ordenados, não poder dispor da sua vida em nenhum dia do ano, já que ficam sujeitos a ver as regras alteradas a qualquer momento?
Jamais! A não ser que tornem o Serviço Militar obrigatório e voltarem a fechar as fronteiras.
O mais certo, portanto, é que o número de generais vá aumentando, com as promoções por antiguidade, e o de praças vá diminuindo pelo total desprezo dos jovens pela carreira militar.
Perde-se muito com isto?
Provavelmente alguma da nossa juventude ficaria mais bem preparada para o resto da sua vida se tivesse de cumprir um ou dois anos de serviço militar.
Eventualmente, poderíamos pensar no cumprimento obrigatório desse serviço por parte daqueles que abandonassem os estudos sem o cumprimento de um determinado objectivo (licenciatura ou curso profissional, por exemplo).
Difícil seria explicar, a estes, a estrutura onde seriam integrados, com mais chefes que funcionários.
O que resta é dar razão à frase de Aldous Huxley: “Há três qualidade de inteligência: a humana, a animal e a militar”.
Vítor Ilharco é assessor
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