Fundo das Bahamas, representado por CEO demissionário, manteve recusa em 'mostrar' investidores

ERC prepara ‘xeque-mate’ ao World Opportunity Fund no controlo da Global Media

por Pedro Almeida Vieira // Janeiro 31, 2024


Categoria: Imprensa

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A demissão de José Paulo Fafe da liderança executiva da Global Media – que detém os periódicos Jornal de Notícias e Diário de Notícias e ainda a rádio TSF – abre portas à ‘bomba atómica’ nunca usada antes pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social: a suspensão dos direitos de voto do World Opportunity Fund. O PÁGINA UM teve acesso aos documentos enviados pelo fundo das Bahamas ao regulador, onde se persiste em não identificar o nome dos investidores, permitindo assim à entidade liderada por Helena Sousa não apenas retirar os direitos de voto à UCAP Bahamas (que gere o WOF) como também confiscar os bens patrimoniais. Resta saber como reagirá o WOF, que aparentemente já investiu 12 milhões de euros na Global Media.


Foram cinco atribulados meses, e hoje mais um episódio se concluiu, e com o habitual estrondo: José Paulo Fafe, CEO da Global Media indicado pelo World Opportunity Fund (WOF) – o fundo de investimento das Bahamas que controla este grupo de media – demitiu-se das suas funções de presidente da comissão executiva (CEO). Em comunicado, o antigo jornalista que era a única face visível do WOF justifica a demissão por “considerar estarem esgotadas as condições para exercer essas funções, nomeadamente os pressupostos essenciais, nomeadamente o necessário entendimento entre acionistas, para levar a cabo a reestruturação editorial que há muito este grupo necessita, único caminho possível para o reposicionamento dos seus principais títulos e marcas, condição indispensável para o seu crescimento e expansão.“

Fafe estava já completamente isolado num Conselho de Administração que perdeu, desde Dezembro, cinco membros: Filipe Nascimento, Paulo Lima Carvalho, Victor Menezes, Diogo Agostinho e Carlos Beja. Na verdade, resta agora apenas o presidente (não-executivo), Marcos Galinha, apesar de deter uma posição na Global Media de forma indirecta e sem direito sequer a voto, uma vez que é parceiro minoritário (49%) do WOF na empresa Páginas Civilizadas. Ou seja, o empresário do Grupo Bel não tem, em teoria, qualquer voz activa, porquanto o fundo das Bahamas possui dois dos três gerentes na Páginas Civilizadas, pelo que é a posição maioritária nessa empresa a ser levada a uma assembleia geral da Global Media.

José Paulo Fafe demitiu-se hoje de CEO da Global Media, mas não revela as intenções do World Opportunity Fund que arrisca muito perder os direitos de voto e ter mesmo os bens ‘confiscados’.

No entanto, embora se ignore ainda se José Paulo Fafe se manterá como gerente das Páginas Civilizadas – que continua a ser o accionista maioritário da Global Media –, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) está na iminência de retirar os direitos de voto do WOF, uma vez que o fundo de investimento mantém a recusa de divulgar a lista nominativa dos seus investidores.

Com efeito, o PÁGINA UM teve acesso aos documentos enviados à ERC por correio registado na quarta-feira da semana passada – e que está em análise por um núcleo muito restrito de pessoas que integram o regulador – onde Fafe justifica que a UCAP Bahamas detem 0,002% do capital da WOF, correspondente a “10 voting non participating shares”, denominadas “management shares” (acções de gestão), mas que, apesar disso, possui a “totalidade dos direitos de voto”. Deste modo, segundo os documentos, “as acções de Investidor não têm direitos de voto”, tendo apenas “direito a participar integralmente nos lucros líquidos da Sociedade e são remíveis de acordo com as disposições” dos estatutos do fundo.

No entanto, o PÁGINA UM sabe que a ERC não vai aceitar como válidos estes argumentos, sobretudo porque como o WOF mantém a intenção de não revelar a lista nominativa de investidores – que serão 50, no máximo, conforme se revelou em primeira mão no passado dia 9 – estará a violar claramente a Lei da Transparência dos Media. Além disso, de forma clara, também o WOF não está a cumprir as regras da identificação do beneficiário efectivo, tendo indicado Clement Ducasse como seu administrador, mas sem acrescentar qualquer “beneficiário da entidade“.

Com efeito, este diploma de 2015 determina que qualquer pessoa ou entidade tem de declarar num portal gerido pela ERC uma participação “igual ou superior a 5% do capital social ou dos direitos de voto de entidades que prosseguem actividades de comunicação social”. Ora, se a UCAP Bahamas declara porque detém direitos de voto acima de 5% (na verdade, a totalidade), o próprio fundo – que tem, aliás, um número de identificação fiscal em Portugal –, também terá de demonstrar que não há ninguém de entre os investidores do WOF (empresa ou pessoa) que tenha mais de 5% do capital.

A persistência do WOF em ‘esconder’ algum ou alguns dos investidores pode assim custar-lhe bem caro, porque a ERC está na iminência de usar a ‘bomba atómica’ nunca antes usada (mas explicitamente prevista) na Lei da Transparência dos Media: a suspensão imediata do “exercício do direito de voto e dos direitos de natureza patrimonial inerentes à participação qualificada” do WOF. E basta uma publicação no site a anunciar formalmente dúvidas sobre os investidores.

Ou seja, a concretizar-se a aplicação deste normativo, o fundo das Bahamas deixará sequer de poder votar – abrindo assim as portas ao controlo tripartido da Global Media por parte de Marco Galinha, José Pedro Soeiro e Kevin Ho –, e até ficará sujeito a uma espécie de ‘confisco temporário’ de bens, uma vez que a lei determina que os direitos patrimoniais “que caibam à participação qualificada afetada são depositados em conta individualizada aberta junto de instituição de crédito habilitada a receber depósitos em território português, sendo proibida a sua movimentação a débito enquanto durar a suspensão”.

Segundo o PÁGINA UM apurou, uma decisão do regulador deverá ser tomada ainda antes do dia 19 de Fevereiro, data de uma assembleia geral da Global Media, agendada pelo seu presidente, o advogado Fernando Aguilar de Carvalho, que curiosamente tem as mesma funções no Banco Atlântico Europa. Formalmente, a ERC adiantou ao PÁGINA UM apenas que “não é possível para já apresentar uma data final para a tomada de decisão, face às diligências ainda em curso”. O vazio na Global Media com a saída de José Paulo Fafe será, com elevado grau de probabilidade, a ‘espoleta’ para uma decisão já nos primeiros dias de Fevereiro que se inicia amanhã.

Recorde-se que esta instituição bancária suspendeu em meados de Dezembro passado as contas da Global Media, incluindo a retenção das contas da Vasp, invocando o impacte mediático do plano de reestruturação então anunciado por José Paulo Fafe. Saliente-se também que Aguilar de Carvalho é sócio da sociedade de advogados Uría Menéndez-Proença de Carvalho. Por sua vez, Daniel Proença de Carvalho foi, recorde-se também, presidente do Conselho de Administração da Global Media, tendo saído em Agosto de 2020. Foi durante a sua presidência no grupo de media que se concretizaria a venda da simbólica sede do Diário de Notícias, na lisboeta Avenida da Liberdade. Outra nota: sabendo-se que o WOF terá já feito entrar 12 milhões de euros, não será previsível que o assunto Global Media se pacifique nos próximos tempos.


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