ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS

Calor matará mais nas áreas metropolitanas de Portugal, mas frio será menos mortífero

por Maria Afonso Peixoto // Março 31, 2022


Categoria: Exame

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Estudo de modelação matemática prevê cenários das alterações climáticas por via do aumento da temperatura do ar na segunda metade do século XXI para as Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto. Mais mortes por causa de ondas de calor, sobretudo nos idosos, mas havendo menos frio no Inverno a mortalidade associada também aos surtos gripais e outras afecções típicas desta estação do ano diminuirão.


As ondas de calor no Verão causarão na segunda metade do século XXI um acréscimo na mortalidade da população idosa na Área Metropolitana de Lisboa que pode superar os 2%. No entanto, o aquecimento global terá, em contraponto, um efeito positivo no Inverno: as vagas de frio poderão ser menos intensas e frequentes, resultando numa redução das mortes.

Estas são as principais conclusões de um estudo, com recurso a modelos matemáticos, realizado por Mónica Rodrigues, investigadora no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT) da Universidade de Coimbra, que previu o impacto das alterações climáticas entre 2051 e 2065 (curto prazo), e entre 2085 e 2099 (longo prazo) das duas áreas metropolitanas do país: Lisboa (AML) e Porto (AMP).

Embora os mais vulneráveis aos efeitos climáticos sejam os idosos (maiores de 65 anos), o estudo estima que na AML todas as faixas etárias sejam afectadas por ondas de calor no Verão. Nesta região espera-se que a mortalidade aumente em 1,58% nos primeiros 15 anos da segunda metade deste século, e em 0,10% nos últimos 15 anos face ao período histórico de referência (1991-2005). No entanto, no caso dos idosos, esse excesso será de 2,2% no período 2085-2099 face a 1991-2005.

Os efeitos na Área Metropolitana do Porto (AMP) serão, contudo, muito mais moderadas, e apenas incidindo nos maiores de 65 anos. Para os idosos estima-se um aumento de 0,23% e de 1,37%, a curto e a longo prazo, respectivamente, na mortalidade associada ao calor. Tal efeito distinto deve-se às menores temperaturas registadas no litoral Norte do país, onde mesmo no Verão, na actualidade, são pouco frequentes os dias acima dos 30 graus centígrados.

Se, por um lado, se prevê um agravamento do impacto do calor no Verão, o frio extremo será menos frequente e isso resultará em menos mortes. Neste aspecto, o estudo da investigadora do CEGOT calcula uma redução na ordem de 0,55% para o primeiro período e de 0,45% para o segundo período face ao período de referência (1991-2005).

O panorama para a AMP – onde faz mais frio no Inverno do que na AML – é até favorável neste aspecto, sendo previsível uma diminuição das mortes causadas pelas baixas temperaturas na ordem de 0,31% a curto prazo e de 0,49% a longo prazo.

Apesar do clima mediterrânico com Inverno amenos, Portugal é um dos países da Europa com maior mortalidade causada pelo frio. A exposição a baixas temperaturas produz alterações na pressão arterial, causando vasoconstrição e aumentando os níveis plasmáticos de fibrinogénio e colesterol, enquanto a inalação de ar frio está relacionada um maior risco de bronquite, pneumonia e exacerbação aguda de doenças pulmonares crónicas, sobretudo em pessoas idosas.

Num estudo publicado em 2015 na revista científica Journal of Public Health sobre o excesso de mortalidade no Inverno em três dezenas de países europeus, através do cálculo de um índice que incluía as mortes nas outras estações do ano, Portugal surgia como o segundo pior, apenas atrás de Malta, e logo seguido por Chipre e Espanha, um fenómeno conhecido por “paradoxo do excesso de mortalidade invernal”.

Mesmo em cidades com clima mais agreste no Inverno, o saldo mostra-se pior em Portugal. Por exemplo, um estudo publicado há pouco mais de dois anos na revista científica Urban Climate estimou que a taxa de mortalidade associada ao frio em Lisboa era de 53,2 óbitos por 100.000 habitantes, enquanto em Londres era de 37,6.

Além da mortalidade, os custos económicos são também bastante elevados. Um estudo também publicado em 2019 por quatro investigadores portugueses na revista científica International Journal of Biometereology apurou que, no período 2009-2012, os custos associados ao internamento de pessoas relacionadas com o excesso de frio do Inverno foram de 214 milhões de euros, atingindo os 226 milhões de euros no triénio 2013-2016.

Em declarações à Lusa sobre este seu estudo, que culminou em tese de doutoramento, Mónica Rodrigues explicou que, nesta fase, teve uma abordagem apenas sobre as áreas metropolitanas “por serem as mais populosas”, mas que pretende alargar às “outras zonas do país”.

Para esta especialista, que tem também desenvolvidos estudos de Epidemiologia e as suas relações com as alterações climáticas, este tipo de investigação “pode e deve influenciar a formulação de políticas [públicas], passando estas a “incluir uma abordagem preventiva”, uma vez que são disponibilizados dados para “a identificação de zonas/áreas geográficas onde o risco [de saúde pública] é mais elevado”.

Texto editado por Pedro Almeida Vieira

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