O azar do mundo pode ser medido em candidatos.
Uma América que tem de escolher entre aqueles dois.
Um Brasil que só tem aqueles dois.
Depois há os países que estão diminuídos pela ascensão de canalhas, desmiolados, fanáticos, tontos, facínoras. O zoo é ilimitado e muito variado. Estes países normalmente perdem a legitimidade democrática porque os tiranos percebem que o Tribunal Constitucional os perturba, as Assembleias da República são forças de bloqueio, os procuradores levantam suspeições.
O grande problema das maiorias absolutas está na construção de poderes eternos. Ninguém deveria governar sem limites. Ninguém devia perpetuar-se no poder. Também as instituições não deviam ser geridas por escolhas políticas ou amizades antigas. Os juízes devem ser fiscalizados e ter uma carreira independente do cartão partidário. Deste modo, construímos as linhas que definem a democracia.
Infortúnio é eleger um canalha sem fronteiras, sem instituições que o vigiem, sem estruturas que fiscalizem as decisões. A democracia tem um pilar na escolha livre dos votos, mas os outros pés da mesa devem incluir a Economia, o primado da Lei, e as instituições que a garantem. A Lei pode mudar? A Lei é como todas as coisas adaptável à dinâmica da vida, mas não a Lei Fundamental que nos garante a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Eu sou um grande adepto de incluir aqui a velocidade temperada por reflexão e a estética.
A rapidez ajuda a melhorar muitas coisas. Portugal está hipotecado por uma Justiça demasiado lenta sobretudo no direito administrativo e na fiscalização das decisões e escolhas do poder. A estética por sua vez traduz uma necessidade de ser mais ético, mais sábio, mais sofisticado.
O pilar económico devia ter uma regra de limitação da capacidade de endividamento de cada governo. Não podemos ter uma distribuição de emprego com base nos partidos, um endividamento com base no deslumbramento dos eleitos. A edificação de obra pública sem qualquer sentido e necessidade.
A Pordata é uma ferramenta fria que nos entrega dados de observação. Devia ser de consulta obrigatória nas escolas. Nela podemos ver o que foi o crescimento da dívida total, da dívida relativa, o custo da administração pública, relacionados ou não com o produto interno bruto (PIB). Na verdade, se lhe colarmos os rostos dos nossos Governos após o 25 de Abril de 1974, temos um modo fácil e limpo de conhecer os grandes gastadores. Sócrates é um campeão, mas na análise relativa Cavaco e Guterres não são de cerimónias também.
O vínculo da governação às obras públicas é uma das grandes fontes das dívidas. A maior, no entanto, é o tamanho da Função Pública. Temos uma enorme quantidade de funcionários, e leis demasiado protectoras das suas ineficiências. A realidade comprova que maus administradores conseguem baixas eficiências. Se toda a gente arrebanhada dos partidos para as Câmaras, SNS, CP, TAP, etc., fosse trabalhadora, e premiada pelo desempenho, íamos carecer de menos gente, e tínhamos melhores serviços.
O Infortúnio é, pois, o que vem de cima. Muito mais dramático para as consequências de uma governação perdulária é a escolha dos seus dirigentes. Se perpetuamos os incapazes de reflexão cuidada, os mancos em decisão sustentada, os lerdos de logística e de organização, construímos um Portugal medíocre e endividado.
Pior infortúnio seria ter de escolher entre lideranças fracas, demagogos e bufões. Mas acho que estamos perto.
Diogo Cabrita é médico
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