RUI ARAÚJO: CADERNO DOS MUNDOS

A aldeia do fim do mundo

minuto/s restantes


Encosta do Lapão.

Freguesia de Montalvão. Alto Alentejo.

A nossa história começa agora neste caminho estreito. Podia ter sido há 50, 60 ou até 80 anos porque nestes montes ásperos e desolados as coisas medram devagar…

Na vereda só os passos lestos e regulares falam agora.

Montalvão não pode morrer.
(Foto: Rui Araújo)

Primeiro encontro. Fernando Castelo. Vai fazer 80 anos. Tem 25 de Guarda Fiscal. Era do Posto de Montalvão no tempo da vida pobre. Fiscalizava a fronteira, a menos de uma légua daqui do caminho…

—  Iam à Espanha quando podiam e vinham, pronto, e era assim. Tinham filhos. Tinham que ganhar algum tostãozito para lhes matar a fome, não é? Era assim o contrabando dantes. Não era aquelas grandes quantidades de mercadoria, não é, porque aqui não podiam transitar em carros nem nada. Era a pé! Não é… Depois, lá traziam… os homens traziam uma saquita em ar de mochila. Elas traziam lá a tal trouxa à cabeça. Era assim… 

Escuto, intrigado.

— O contrabando aqui era mais baseado, é pá, coisas, vamos lá: calçado, bolachas, rebuçados, pratos de Pyrex… Elas levavam daqui café para lá. Era assim. E a gente, geralmente, o café, como havia cá muito café, não é, a gente raramente olhávamos para isso. Às vezes, lá coiso… E elas lá levavam o cafezito, não é, era a sobrevivência delas. Elas vendiam o café lá bem vendido aos espanhóis naquela altura e depois a gente, às vezes, deixava-as ir, mas, às vezes, avisávamos-as: Vocês têm, pronto, levem lá o café e tal ou voltem lá para trás. E tal.

A travessia ilegal da fronteira dava direito a multa de 500 mil réis… uma fortuna naqueles tempos.

No silêncio da fraga damos com um abrigo de xisto dos contrabandistas.

Fernando Castelo, a memória destas veredas…
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

Era neste buraco sombrio e desconsolado que se refugiavam quando já não tinham ânimo para seguir caminho por causa  da geada ou da neve ou da Guarda Fiscal.

Uma coisa, porém, é certa. O contrabando não se apaga na lembrança de Montalvão mesmo se o tempo dos arrepios e das orações já pertence irremediavelmente ao passado…

Metemos pelo caminho tosco – encosta abaixo.

Rio da Nogueira.

Ver para crer…

O rio é um lodaçal infecto e gorduroso, para não dizer ensebado.

O verdor é das algas tóxicas, dos fetos e das plantas aquáticas (como a azola, que vem dos trópicos).

O rio está poluído, mas ninguém sabe de nada…
(Foto: Rui Araújo)

A concentração de fósforo, nitratos e outros poluentes é uma explicação. A incúria ou a apatia cúmplice do Governo português em relação à poluição é outra…

A GNR não tem em curso (25 de Novembro de 2021) qualquer investigação referente a crimes ambientais no rio Sever.

É tempo de regressarmos sem mais delongas a Montalvão pelos mesmos caminhos ermos.

É que a partir daqui não se pode ir mais para norte.

E a fronteira, aqui tão perto, só está aberta ao fim-de-semana…

A convivência era outra antigamente…
(Foto: Rui Araújo)

Depois de a manhã romper, Montalvão, vista de longe, é mais uma aldeia do Alto Alentejo debruçada sobre uma colina que corre o horizonte e é um gosto vê-la.

Montalvão é uma terra de gente humilde, trabalhadora e honrada, que vivia da enxada e do gado e, quando era mesmo preciso, do contrabando.

É, hoje, mais um povo da raia que está a definhar. E de que maneira…

Em 2011, viviam, aqui, 442 fregueses.

Em 2021, restam 290.

Feitas as contas, a povoação perdeu 34,4% da população no espaço de 10 anos.

E em 1940 havia 2.672 habitantes, ou seja, 9 vezes e tal mais do que hoje.

Desde então a população não parou de diminuir. Os dados do INE são peremptórios. E, como se não bastasse, a maioria tem, hoje, mais de 70 anos de idade…

Encontro (in)esperado com Tchá Jaquina do Possidónio na Casa do Povo.

— É uma solidão muito grande. É, sim senhora. Uma solidão muito grande. É. O meu marido foi para o lar. E tenho sentido muita falta dele porque já somos casados há 60 e tal anos. 64 anos. Já fez no dia 13 de Maio… de Outubro. E, então, eu sinto aquela solidão.

Mudo de conversa. 

A solidão imposta é terrível. E sem família, vizinhos e amigos é a morte social garantida.

— Como é que isto era antigamente?

— Ai… muito… quer dizer, havia muita gente. Mas eu passava… Nós passáramos muito mal porque o meu pai que Deus tem era contrabandista.

Dias difíceis, acrescento. É uma desculpa de mau pagador.  Eu não tenho respostas.

— Havia fome. Nós passámos fome. Não tenho coiso nenhum de dizer isto porque o meu pai não tinha o trabalho como já contei.

— E o seu pai era contrabandista!

— Era contrabandista. Apanhava umas coisas e nem sequer o contrabando era nosso. Ele era alugado. A pessoa pagava, não sei se era 15 escudos, para o meu pai levar uma mala. Ainda chegou a estar preso… Quando lá passo, vamos para a ginástica, lembra-me aquelas muralhas ali e que era a cadeia…

Dantes as casas eram todas habitadas. Hoje, muitos prédios estão vazios. E há ruas desertas de gente…

Tchá Jaquina do Possidónio.
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

Montalvão tinha câmara municipal, hospital, escola, três postos da Guarda Fiscal e um da GNR, cadeia, matadouro, seis salsicharias, quatro talhos, quatro alfaiates, barbeiro, sapateiro, costureira, ferreiro, armeiro, latoeiro e 12 tabernas… Mais a ervanária do senhor Domingos Paixão que curou meio mundo…

Só na rua Direita havia quatro mercearias (Ti Zé Ramalhete, Tchá Hermínia, Sozé da Loja, Tchá Efigénia), sem contar com o estabelecimento do Ti João Cabreira, do Ti Possidónio Relojoeiro (que «morreu de velho»), mais o centro comercial do senhor Joaquim Morujo, que vendia fazenda, materiais de construção e bicicletas.

Havia… porque, hoje em dia, já só há a mercearia.

Montalvão é, hoje, mais um território economicamente deprimido a somar a tantos outros da raia…

Tem três cafés, um lagar, uma farmácia que depende da de Gavião e um mercado que abre 3 dias por semana.

Mas não vamos antecipar as agruras.

Os locais de convívio são escassos.
(Foto: Rui Araújo)

A escola primária de Montalvão está fechada desde 1998. Chegou a ter 4 professores. Cada turma tinha 36 ou 37 alunos. Muitos pais não mandavam as cachopas para a escola. Não tinham posses para mandar estudar os filhos todos. É uma explicação.
A escola é agora o museu da terra.

Regresso ao passado.

Encontro António Pires Lopes no primeiro piso do edifício austero.

Foi professor, aqui, durante 28 longos anos. Cumpriu 85 anos.

— As aulas começavam às 9 da manhã. Havia um pequeno intervalo. Um intervalo aí de 1/4 de hora para os que queriam brincar, correr, fazerem os jogos tradicionais daquela época. São muito diferentes do que é hoje. Hoje, uma criança passa o tempo com o telemóvel. E naquele tempo jogava o peão, jogava macaca, jogavam à cabra-cega. As meninas tinham outros jogos. Até tinham um… Havia um jogo que era atirar à malha, que era feito na Primavera. As crianças divertiam-se muito…

—  E os professores? — pergunto ou insinuo.

— Eu jogava peão com eles. E eu conseguia atirar o peão, o peão não ia ao chão e eu apanhava-o a rodar na palma da mão. E eles procuravam fazer o mesmo…

— E a disciplina? Como é que era?

— Eu nunca castiguei severamente um aluno com zanga. A régua trabalhava, mas era muitas vezes trazida para a escola pelos pais dos alunos. Quando a régua se estragava, o pai do aluno trazia uma régua para a escola. Portanto, os pais não estavam contra uma reguada. (Ri-se) É assim.

António Pires Lopes
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

E nós não pedimos contas!

Ficaram os móveis e as fotos baças que ajudam a preservar a lembrança de um saudoso passado ou tão simplesmente da juventude.

António Pires Lopes é bom homem. E devia ser bom professor.

— Muita saudade desse tempo. Muita saudade…

— As coisas, hoje, são diferentes.

— O que mudou foi o êxodo da população para os grandes centros urbanos. Os campos deixaram de ter trabalhadores. Os campos deixaram de ser semeados, cultivados. E aqui se produzia tanto trigo, tanto centeio, aveia e cevada e tanto linho. Tanto linho daqui saía para fazer os mais diversos tecidos. E actualmente já não se semeia. E é pena que isso aconteça. E o que se passa aqui passa-se por esse Alentejo fora…

Percorremos ruelas asseadas condenadas a um silêncio que mete impressão. Dá vontade de abalar…

A padaria está fechada, mas lá dentro damos com Sérgio Pereira a amassar o pão.

Hoje, é homem para fazer 100 pães de trigo mais uma data de bolos de azeite e de «guleimas», os bolinhos de canela cá da terra.

Só há pão branco, é o que os freguezes preferem…
(Foto: Rui Araújo)

O forno é de lenha: eucalipto e xara (esteva), como manda a tradição.

Lá ao fundo, Tchá Nazaré, 85 anos, observa o filho com candura.

É o momento da oração e do sinal da cruz na massa.

«Deus te acrescente agora e sempre.»

Ela (mais o marido, que Deus tem) eram padeiros no burgo.

E não lhes faltou freguesia durante longos 52 anos.

— Faço sempre a reza. Sempre. Eu sou muito religiosa. Vossemecês não são… (Ri-se)

É preciso ter fé. Ela comeu o pão que o Diabo amassou. Tal como os seus pais…

— O meu pai era moleiro e ia moer ao rio Sever. E… e depois levava os talegos, chamavam-se os talegos, levava o trigo das pessoas que tinham o trigo para moer. E a minha mãe com as maquias, chamava-se as maquias, com as maquias que o meu pai trazia de moer o trigo fazia o pão.

Esta gente simples e comunitária vivia da terra.

Memórias gastas e amarelecidas…
(Foto: D.R.)

As coisas mudaram.

E relembrar no papel as horas passadas é – como se costuma dizer – viver outra vez.  

— Morreu o meu marido já há ano e meio. Eu estava sozinha. E estava aqui um pouco coisa… Para distrair, vou… a ver se sou capaz de escrever o livrinho da minha vida.

Diz-se que escrever é viver duas vezes…

— O meu livro começa assim: «Vou contar as minhas memórias da minha vida. Primeiro, são os meus pais…»

Tchá Nazaré só estudou até à 4ª classe, mas sempre gostou muito de ler e de escrever.

— Já não tenho mãe nem pai nem… nem sogros. Os meus sogros também eram muito bons. Não tenho nada. O meu sogro foi à guerra da… da… da…

O sogro, António Pereira, foi um dos 24 homens de Montalvão que combateram na Grande Guerra.

Embarcou para França no dia 23 de Março de 1917.

A presença portuguesa na Grande Guerra: carne para canhão.
(Foto: D.R.)

Era o soldado maqueiro número 290.

Integrava o 3º Grupo de Companhias de Saúde – Companhia Automóvel de Transporte de Feridos.

Esteve várias vezes internado, mas acabou por regressar a casa depois do conflito. Mais precisamente a 19 de Maio de 1919.

O facto de ter ido encomendar-se a Nossa Senhora dos Remédios na ermida do outro lado de Montalvão é uma coincidência (ou talvez não).

A devoção à Senhora dos Remédios ainda é uma realidade apesar de a padroeira da terra ser Nossa Senhora da Graça.

Ao cimo da rua Tchá Mourata.

93 anos cheios de alento.

É dia de ir buscar os remédios ao posto (ao lado de mais uma casa à venda), que depende da farmácia de Gavião.

A caminhada a passos vagarosos é uma forma de enganar o tempo e as agruras do presente.

Tchá Mourata cumpriu-se sem lamúrias. Já perdeu o marido e 3 filhos.

A memória viva de Montalvão.
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

— Não há mas é aqui quase ninguém. É uma terra boa e nós somos da geração maior que cá há. Dos Zabumbas, que é a geração do meu primo. Sabe… tudo gente boa. Está-me a filmar…

A velhota sorri. Um sorriso franco e jovial.

— É uma terra boa para os velhos? — ouso perguntar, maneira de meter conversa.

— É, sim senhor. A nossa terra é saudável, a nossa vila.

— E o que é que falta?

— O que é que falta? Falta-nos aqui muita coisa. Não temos cá um transporte. Não temos cá nada!

— Antigamente havia mais gente aqui. Na nossa vila não havia casas que chegassem. Agora, está tudo de sobra…

O poder central — em vez de alargar os horizontes, que continuam a definhar — esqueceu-se, ignorou a raia…

Montalvão é uma povoação excomungada. Mais uma…

No espaço de meio século deixou de haver progresso e crescimento demográfico por estas bandas.

Montalvão é um território envelhecido e economicamente deprimido…

Empregos, aqui, só os do lar da Santa Casa (o costume!), da junta de freguesia e da exploração agrícola.

Rogério Belo tomou posse há pouco tempo como presidente da Junta.

Rogério Belo
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

É um homem da terra decidido a combater o isolamento e o desconsolo. E a morte programada…

— A prioridade, hoje, como presidente da Junta de Freguesia de Montalvão é tentar inverter o sentido do envelhecimento populacional. Montalvão tem perdido população. Já não é de hoje. É de há vários tempos. Temos de dar dignidade aos mais velhos e tentar puxar os mais novos para a aldeia.

Puxar os mais novos para a aldeia para cuidarem dos mais velhos.

Pode ser essa a solução para Montalvão não morrer. É preciso encontrar respostas políticas e técnicas, começando pelo acesso às comunicações.

O presidente da junta, por exemplo, tem de ir para o meio da rua para poder usar o telemóvel.

A construção da ponte sobre o rio Sever (entre Montalvão e Cedillo, em Espanha) – um investimento de 9 milhões de euros, cujo contrato de financiamento foi assinado este ano, – não só aproximará o Alentejo da vizinha Extremadura, mas terá ainda impactos económicos e sociais em toda a raia.  

A fronteira que existe só está aberta ao fim-de-semana. É a única fronteira privada da Europa, aliás. Ver para crer…

A eléctrica espanhola Iberdrola decide quando e como os cidadãos podem passar. E decide ainda qual é o caudal do rio…

A única fronteira privada da Europa!
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

Tchá Graça.

80 anos.

O seu destino, esta tarde é o Chão da Porta de Baixo.

— Venho aqui para a horta para não estar todo o dia lá em casa. E, assim, corto… Se eu me levantasse e não saísse de casa chegava a pontos que… que sei lá o que eu era. E, assim, não…

A horta é um paraíso que requer muita labuta, mas ela quer lá saber…

Tchá Graça não vai em mexericos!

— Gosto de mexer na terra. Gosto de ver as coisas a nascer. Gosto de as colher quando elas são bonitas. Gosto. (Ri-se) É assim: gosto!

A horta é remédio santo para matar a solidão, esquecer os desenganos e os sonhos de antanho ou nem por isso…

Tchá Graça
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui Pereira/TVI)

— A gente dantes não tinha, se calhar, nem sonhávamos… Sonhávamos logo com o que tinhamos de ser porque eu até podia ter ido para a estudar, que a minha professora foi pedir ao meu pai que me levava para casa dela para eu estudar lá e que não me levava nada de pensão. Mas eu tinha dois irmãos mais velhos. Que não podia estudar, não podia. O meu pai disse logo que não podia fazer isso porque tinha lá dois filhos homens e não tinham ido a estudar. Não podia mandar a filha. E, pronto, fiquei assim…

As quimeras da adolescência resistem ao tempo.

— E levou muitas reguadas?

— Ai, não…

— Tem cara disso…

— Não. Não. Não. (Esboça um sorriso) Não levei. (Ri-se) Era uma menina muito bem comportadinha! (Ri-se muito) E ainda hoje sei muitas lições de cor. (Ri-se)

— A primeira do livro da 4ª classe: «Olha, lá vai o Gonçalo.» Quer mais? (Desata a rir)

Quero mais.

— Olhem: lá vai o Gonçalo caminho da Escola… além… Vamos depressa apanhá-lo, vamos com ele também. Tem sido meu companheiro da primeira à quarta classe: pontual como o primeiro, nunca vi que ele faltasse! É bondoso e aplicado cortês e respeitador; por isso é tão estimado pelo nosso professor. Não é tolo nem se gaba de saber sempre as lições; conforme começa, acaba, modesto, em pretensões. Lá vai: nunca se demora no caminho a conversar, chega sempre antes da hora: — é um aluno exemplar! Rapazes! vamos a ver se sabemos imitá-lo!… se podemos proceder em tudo como o Gonçalo.

A instrução primária de antigamente…
(Foto: Rui Araújo)

Santo André.

A manhã vai alta.

Tónho Foguete.

Tem 74 anos.

Foi pescador, funcionário público, lavrador e contrabandista.

— Agora é para eu falar, não é? Ah… Apanhávamos aqui 30 quilos de café e íamos… apanhávamos depois do sol posto. E depois chegávamos a Cedillo à meia-noite. Tomávamos uma sandes de cavala e uma cervejinha e vou de carga em cima: galletas ou garrafas de cognac ou uísque. Quando era galletas, a gente vinha bem. Ou alpargaitas ou isso, vinha bem. Agora quando era  garrafas de cognac a gente via-se à rasca para… para chegar cá. Chegávamos aqui à volta das 5 da manhã… (Ri-se) e o meu pai andava já pelo rio…

Escuto o meu entrevistado bonacheirão e assaz divertido.

— Ele já andava burrico (significa“zangado”). Tinha muito medo da Guarda Fiscal. (Ri-se) E… E depois, ele um dia de manhã caçou-me. Bom, então tu andas nesta vida? Que eu andava no contrabando… (Ri-se) Untou-me quase o pêlo. E depois ficámos amigos outra vez. É assim a vida!

É mesmo…

Passavam pela cascata da Marineta, atravessavam o rio a pé e depois calcorreavam as veredas espanholas até Cedillo, o destino.

—Uma vez, quando a minha irmã tinha 12 anos, fomos ali mais a minha mãe a Cedillo e depois aconteceu uma coisa. A minha mãe trazia uns sapatinhos para a minha irmã, tinha ela 12 ou 13 anos. Trazia uns sapatinhos… Ah… Um Guarda tanto esteve ali, coiso, Ah, a Senhora leva qualquer coisa na barriga. E a… minha mãe chegou lá atrás. Tome lá os sapatos que era para a minha gaiata. Para a minha gaiata… Pronto. Eu depois digo assim: Eu não deixo que tu caias da mota. E ao fim de pouco tempo caiu da motorizada. (Ri-se) Seria eu que lhe roguei a praga?

Por mais que a gente não acredite, sempre há coisas…

Tónho Foguete.
(Foto: Captura a partir de imagem de Rui pereira/TVI)

Por precaução, torno ao presente.

— E agora? Como é que é a sua vida? Já não é contrabandista…

— Não. Já estou reformado. (Ri-se muito)

O que importa é viver. E viver bem de preferência.

Montalvão é uma aldeia no fim do mundo, mas é sobretudo uma dessas terras de Portugal onde pegamos de estaca.


NOTA:

Reportagem emitida originalmente na TVI, em Dezembro de 2021 [VER AQUI].


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