Um dos principais conselheiros de Anthony Fauci, o rosto da estratégia de gestão da pandemia nos Estados Unidos, foi apanhado num esquema para apagar e esconder informação de relevo sobre a covid-19, violando a lei. Em audições e e-mails obtidos por uma Comissão na Câmara dos Representantes que investiga a pandemia, existem indícios de que o próprio Fauci terá violado a lei, ao apagar e-mails oficiais e ao usar canais privados para trocar informação oficial sensível. No centro da polémica, estão as suas ligações a uma organização ‘caça-vírus’ financiada pelos Estados Unidos, a EcoHealth Alliance, que está no centro de suspeitas sobre o origem do novo coronavírus, que levou a cabo investigação que envolveu a manipulação perigosa de vírus num laboratório em Wuhan, na China, região onde terá surgido o SARS-CoV-2. Biden já suspendeu mesmo, este mês, o financiamento da EcoHealth e do presidente desta organização, Peter Daszak.
Um conselheiro de topo do National Institutes of Health (NIH), uma agência governamental de investigação do Departamento de Saúde dos Estados Unidos, apagou registos oficiais sensíveis para se desvendar a real origem da pandemia de covid-19. Como se isso não bastasse, este assessor, David Morens, ainda usou canais de comunicação privados (não-oficiais) para ajudar o seu ‘chefe’ Anthony Fauci, o rosto da gestão da pandemia nos Estados Unidos, a esconder informação sobre o financiamento obscuro de pesquisas perigosas com vírus num laboratório em Wuhan, na China.
Documentos obtidos pela Subcomissão sobre a Pandemia de Coronavírus da Câmara dos Representantes mostram que aquele que foi um dos principais assessores de Fauci apagou e-mails oficiais e usou métodos para fugir aos pedidos FOIA [Freedom of Information Act], que correspondem à satisfação de pedidos de acesso a informação nos Estados Unidos. Em e-mails escritos por Morens, é sugerido que Fauci também terá apagado e-mails oficiais e usado canais privados para trocar informação sobre assuntos profissionais.
Em causa está uma aparente conspiração para apagar o rasto de informação sobre a EcoHealth Alliance, uma organização privada que tem beneficiado de financiamento dos Estados Unidos e que conduziu investigação de manipulação de vírus num laboratório em Wuhan, região onde se pensa que surgiu o novo coronavírus. Fauci foi director do National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID) entre 1984 e 2022, quando se reformou. O financiamento à EcoHealth foi atribuído pelo NIAID e pelo National Institutes of Health (NIH), uma agência governamental de pesquisa do Departamento de Saúde dos Estados Unidos.
Para já, as audições e documentos trazidos a público pela Subcomissão tiveram consequências: o NIH suspendeu o financiamento da EcoHealth e, mais recentemente, suspendeu também o financiamento ao presidente desta organização, Peter Dazsak.
De resto, Peter Daszak, foi já ouvido na Subcomissão sobre a Pandemia de Coronavírus, nos Estados Unidos, que tem investigado o que se passou na pandemia.
Recorde-se que em Abril de 2020, a Administração Trump até já tinha ordenado o fim da concessão de financiamento à EcoHealth. Numa carta datada de 19 de abril desse ano, o NIAID notificou a EcoHealth que estava a analisar alegações de que o Wuhan Institute of Virology (WIV) libertou o coronavírus responsável pela pandemia de covid-19. Mas, em 2023, a Administração Biden retomou o financiamento desta organização, que tem recebido, em média, 625 mil euros anuais em fundos federais.
Agora, numa audição na Comissão, David Morens admitiu a proximidade ao presidente da EcoHealth: “Peter Daszak… é meu amigo pessoal há quase 20 anos”, afirmou.
Segundo um comunicado da Subcomissão, foram encontradas “evidências esmagadoras do próprio e-mail do Dr. Morens de que ele se envolveu em má conduta grave e acções potencialmente ilegais enquanto servia como conselheiro sénior do Dr. Fauci durante a pandemia de covid-19”.
A Comissão teve acesso a “correspondência de e-mail não divulgada anteriormente, obtida por intimação, que incrimina o Dr. Morens por minar as operações do Governo [federal] dos Estados Unidos, eliminando ilegalmente registos federais sobre covid-19, usando um e-mail pessoal para evitar a Lei de Liberdade de Informação (FOIA), e repetidamente agir de forma imprópria para um funcionário federal”.
Além disso, a Comissão revelou “novos e-mails sugerindo que o Dr. Fauci estava ciente do comportamento nefasto do Dr. Morens e pode até ter-se envolvido em violações de registos federais”.
Segundo a Comissão, o próprio Fauci “estava potencialmente ciente, e pode ter-se envolvido, no acto de minar as operações do Governo dos Estados Unidos, ajudando o Dr. Morens a canalizar informações internas do NIH para o presidente da EcoHealth Alliance, Dr. Peter Daszak”. Isto porque, “nos e-mails pessoais do Dr. Morens, ele mencionou falar com o Dr. Fauci sobre o financiamento suspenso da EcoHealth e detalhou como o Dr. Fauci pretendia proteger o Dr. Daszak”.
Além de Peter Daszak, surgem nos registos agora obtidos alguns e-mails trocados com Peter Hotez, um médico muito popular nos media mainstream. Não surpreende que Hotez seja próximo do grupo de Fauci, já que é conhecido por defender sempre as posições oficiais e das farmacêuticas e por ter um discurso de ódio contra pessoas que não tomam as vacinas contra a covid-19.
Além dos e-mails comprometedores, em que fica claro o esquema montado para apagar e esconder informação crucial, Morens escreveu comentários misóginos em e-mails oficiais, o que gerou fortes críticas e condenação.
Este caso está a provocar um abalo político e nas instituições dos Estados Unidos e pode levar à queda em desgraça de Fauci, sempre muito acarinhado e protegido pelos media mainstream, apesar das suas ligações ao caso EcoHealth. No início dos trabalhos, os media quase não noticiavam as revelações desta Subcomissão, mas agora, perante a dimensão do escândalo, já começaram a surgir artigos em órgãos de comunicação social como a Newsweek, a CNN e o New York Times.
Foi através da ‘figura tutelar’ de Fauci que se promoveram medidas radicais durante a pandemia, incentivando-se também a perseguição e censura de prestigiados académicos e cientistas, nomeadamente de universidades de renome como Harvard e Stanford, incluindo os autores da Declaração de Great Barrington, que defendiam uma gestão mais racional e proporcional, baseada na evidência. Fauci também incentivou a perseguição e segregação de pessoas que optaram por permanecer sem as novas vacinas contra a covid-19, as quais podem provocar efeitos adversos, como todos os medicamentos. Houve mesmo despedimentos por causa da opção, que têm sido revertidos pelos tribunais.
As últimas revelações da Subcomissão norte-americana ameaçam assim ditar a ‘queda’ de Fauci de um pedestal em que a imprensa mainstream e a Administração Biden o colocaram face à recente onda de indignação.
“Aquilo que encontrámos é uma operação de encobrimento de proporções enormes, em que pessoas estavam a usar estratagemas para evitar os FOIA [pedidos de acesso a informação], estavam a usar contas pessoais para assuntos estritamente profissionais e em que havia pessoas a discutir como esconder os factos”, disse o congressista republicano Rich McCormick numa entrevista televisiva. O congressista, que também é médico, defende a responsabilização dos envolvidos naquilo que considera uma conspiração.
Na sua conta na rede X, o congressista também escreveu: “Os contribuintes americanos devem estar indignados com o facto de o seu dinheiro suado ter ido para financiar a investigação de ganhos de função num laboratório comunista chinês que libertou uma praga global que matou milhões de pessoas”.
“Estou ansioso por responsabilizar seriamente o Dr. Fauci [hold his feet to the fire] sobre o que realmente aconteceu, em algumas semanas”, concluiu.
Um outro congressista republicano, Brian Babin, escreveu, por sua vez: “Um importante conselheiro do NIH [National Institutes of Health] apagou registos críticos para descobrir as origens da covid-19 e usou canais privados para ajudar Fauci a financiar pesquisas obscuras de ‘ganho de função’ em Wuhan”. “Claramente, o NIH estava cheio de criminosos burocratas ansiosos para enganar os americanos com os seus esquemas secretos”, adiantou o republicano que também é dentista.
Mas os ataques à conduta de Fauci já não têm sequer uma base ideológica, e é isso que está a transformar este inquérito da Câmara dos Representantes. Mesmo congressistas democratas têm ficado chocados com as revelações. “Aquilo que descobrimos é profundamente perturbador para mim”, afirmou o democrata Raul Ruiz, também médico, em reacção à audição de Morens. Afirmou ainda que o comportamento do conselheiro de Fauci é “uma mancha” para o NIH. “Não é anti-ciência responsabilizá-lo”, afirmou.
Desde cedo que vários responsáveis de Saúde nos Estados Unidos tentaram distrair as atenções da possibilidade que a pandemia surgiu de uma fuga de um laboratório e tem havido pressões sobre as plataformas digitais para censurar informação e também sobre a comunidade científica. Logo no dia 1 de Fevereiro de 2020, Anthony Fauci e Francis Collins, que foi o director do NIH entre 2009 e dezembro de 2021, juntaram uma dezena de cientistas numa teleconferência para discutir a covid-19, onde foi comunicada como hipótese muito provável uma fuga de um vírus do laboratório em Wuhan, e de que o vírus podia ter sido manipulado geneticamente.
Apenas três dias depois desta reunião online, a 4 de Fevereiro, quatro participantes dessa teleconferência foram autores de um artigo intitulado “The Proximal Origin of SARS-CoV-2” (Origem Proximal) e enviaram um rascunho a Fauci, para edição e aprovação antes da sua publicação final na Nature Medicine. O objectivo era claro: ‘eliminar’ de imediato a tese sobre uma possível fuga laboratorial do SARS-CoV-2.
Contudo, a 16 de Abril de 2020, pouco mais de dois meses após a teleconferência original, Collins enviou um e-mail a Fauci onde expressava consternação porque o artigo afinal não eliminou por completo a tese de fuga de laboratório e questionava sobre o que se mais se podia fazer para derrubar essa hipótese. No dia seguinte, depois de Collins ter explicitamente pedido mais pressão pública, Fauci citou o artigo “Proximal Origin” no pódio na Casa Branca quando questionado sobre se a covid-19 tinha tido origem num laboratório.
Quatro anos depois, não se apurou ainda as origens da covid-19, que terá surgido inicialmente em Wuhan. A tese do mercado de Wuhan, e da ‘passagem’ através de morcegos ou pangolins, foi sempre a mais seguida pela imprensa mainstream e ‘garantida’ por fact-checkers supostamente independentes. Em Março de 2021, a Organização Mundial de Saúde publicou um extenso documento de 120 páginas com as conclusões de uma investigação conjunta, previamente acordada, com as autoridades chinesas sobre a origem do SARS-CoV-2. E descartou logo a possibilidade, sem qualquer base científica, de um acidente nos laboratórios existentes em Wuhan, dizendo taxativamente que é uma “hipótese extremamente improvável” [extremely unlikely pathway]. Mas no ano passado, o próprio director do FBI, Christopher Wray, indicou a fuga laboratorial em Wuhan como sendo a origem mais provável, tese que não foi ainda admitida pela Administração Biden.
De uma forma clara, apesar de ser considerada como uma hipótese forte para a origem da covid, a tese de uma fuga de um laboratório foi censurada pela Administração Biden, que influiu para as redes sociais censurarem esse tema em 2021, como o PÁGINA UM noticiou.
Certo é que o laboratório de Wuhan foi um centro de pesquisas sensíveis envolvendo coronavírus, tornando assim uma ‘fuga’ como algo mais do que tecnicamente provável. Sabe-se que em Maio de 2014, o NIH atribuiu um financiamento, com o Número 1R01AI110964-01, a um projecto da EcoHealth intitulado “Understanding the Risk of Bat Coronavirus Emergence” (Compreendendo o Risco da Emergência de Coronavírus de Morcego”, que oficialmente decorreu até 31 de Maio de 2019.
No resumo deste projecto, anterior à pandemia – e portanto do ‘nascimento oficial’ do SARS-CoV-2 -, referia-se que, com base em coronavírus existentes em morcegos da região de Wuhan, além de outras tarefas, seriam usados nesta investigação “dados de sequência da proteína S, tecnologia de clones infecciosos, experimentos de infecção in vitro e in vivo e análise de ligação ao receptor” para testar eventuais ‘saltos zoonóticos’.
Além de ser o presidente da EcoHealth, Peter Daszak era o Investigador Principal (PI) daquele projecto que listava como parceiro o Wuhan Institute of Virology, na China.
O projecto envolvia “o estudo de agentes altamente patogénicos, o que exigiu a adesão do principal beneficiário (EcoHealth) e do seu parceiro (WIV) aos requisitos específicos de segurança de biocontenção (biossegurança)”, segundo o NIH. Ou seja, “esta subvenção estava sujeita aos requisitos de biossegurança estabelecidos” no NIH.
Em 17 de Outubro de 2014, a Casa Branca anunciou uma pausa no financiamento de projectos de investigação ‘gain-of-function’ (GoF) que pudessem “conferir atributos a vírus da gripe, da síndrome respiratória do Médio Oriente (MERS) ou da síndrome respiratória aguda grave (SARS)”, aumentando a sua “patogenicidade e/ou transmissibilidade em mamíferos por via respiratória”, como aconteceu com o SARS-Cov-2.
Numa carta data de 28 de Maio de 2016, enviada ao NIH, em resposta a um pedido de informação sobre um outro projecto financiado pelo governo norte-americano, com o Número 5R01AI110964-03, a EcoHealth explicou que o objetivo do trabalho proposto era construir MERS e coronavírus (CoVs) quiméricos semelhantes ao MERS, a fim de compreender as origens potenciais do MERSCoV em morcegos, estudando em detalhe os CoVs semelhantes ao MERS de morcegos.
A carta da EcoHealth tentava evitar que o financiamento para este projecto fosse travado devido às novas normas que proíbam o GoF. Nessa carta, a EcoHealth afirmava que acreditava que era altamente improvável que o trabalho proposto tivesse qualquer potencial patogénico.
Agora, na sequência das pressões provocadas pelas revelações da Subcomissão durante o presente mês de Maio, o NIH requereu informação específica à EcoHealth e ao WIH. Não obtendo respostas, concluiu que “a pesquisa no WIV provavelmente violou os protocolos do NIH em relação à biossegurança”.
No início deste mês, a EcoHealth ainda mantinha três projectos financiados pela Administração Biden: o projecto número 5U01AI151797-04 sobre “Understanding Risk of Zoonotic Virus Emergence in Emerging Infectious Diseases (EID) Hotspots of Southeast Asia”; o projecto número 5U01AI153420-04 sobre “Study of Nipah virus (NiV) dynamics and genetics in its bat reservoir and of human exposure to NiV across Bangladesh to understand patterns of human outbreaks”; e o projecto número 5R01AI163118-02 sobre “Analyzing the potential for future bat coronavirus emergence in Myanmar, Lao”.
Segundo o NIH, “uma revisão do texto resumo da base de dados RePORTER do NIH documenta que
os números de concessão de financiamento 5U01AI151797-04, 5U01AI153420-04 e 5R01AI163118-02 são exclusivamente focados em doenças infecciosas emergentes, agentes patogénicos altamente transmissíveis ou novos vírus”.
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