Nenhuma outra coisa se afigura mais obscura ao génio e simultaneamente mais clara ao néscio do que a natureza das coisas. Sendo tudo e nada, tocando o corpóreo e o incorpóreo, tangendo o incognoscível e o sabido, tratando do desmesurado infinito e do imensurável infinitésimo, tropeçando no inanimado e no animado, e transcorrendo o nominado e o inominado – que, em abono da verdade, podem ser a mesma coisa, dependendo do conhecimento das coisas que cada um detém –; repito de novo: e transcorrendo o nominado e o inominado, dissertar sobre coisas pode resultar em tratado de epistemologia, ou simplesmente redundar em sudário de imbecilidades. Sai sempre uma das duas coisas.
Fina e ténue é a fronteira entre uma coisa e uma outra. Temo, assim, que, por ausência de aptidão, por falhas de preparação, e por inabilidades de volição, abrolhe deste texto coisas sem jeito, triste desenlace para quem, em seu íntimo, até almejava coisa grande, nada menos que coisa maior que Da Natureza das Coisas, do filósofo romano Tito Lucrécio Caro – ou, para dar ares de coisa grandíloqua, do autor do poema De Rerum Natura, que isto de escrever em latim é outra coisa.
Antevejo que escrevendo eu assim todas estas coisas sem conta, pensareis, talvez com razão, que me deu coisa má, que já não digo coisa com coisa, e que, enfim, este texto não é lá grande coisa. E, de facto, não estou bem em mim, que ontem sucederam-me coisas do arco-da-velha, que desconfio terem sido coisas do coisa-ruim. Apenas vos digo que se me ficaram bem pretas as coisas, e só depois de obrar coisas e loisas consegui escafeder-me do demo.
Portanto, não tive sezão para melhor endireitar a coisa, ou seja, compor um decente texto. E, por isso, se desprazimento aqui vos trago, desculpai qualquer coisinha. Ou então, parafraseando Machado de Assis nos prolegómenos de Memórias Póstumas de Brás Cubas, se esta coisa não te agradar, fino leitor, talvez seja melhor te pagar “com um piparote, e adeus”. Ou coisa e tal.
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