Apenas em 16 municípios (num total de 308) se nasceu mais do que se morreu

Saldo natural em 2023: só uma capital de distrito não tem valor negativo

woman and child grayscale photo

por Pedro Almeida Vieira // Julho 13, 2024


Categoria: Exame

minuto/s restantes

Por via da emigração, em 2023 bateu-se o recorde de habitantes em Portugal, e observa-se um incremento da natalidade em diversas regiões do país, sobretudo na Grande Lisboa (onde nasceu uma em cada quatro crianças), com Odivelas e Loures à cabeça, que até já suplantam os ‘níveis históricos’ do município açoriano da Ribeira Grande, que mesmo assim continua a ser a região que mais cresce por via do saldo natural. Nesse aspecto, Portugal continua pelas ruas da amargura: nos valores do ano passado, só se contam 16 concelhos onde se nasceu mais do que se morreu, e houve mesmo alguns que perderam, por esta via, mais de 2% da sua população em apenas um ano, com Gavião em triste destaque. O PÁGINA UM analisou em detalhe os recentes dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), tendo constatado também que subsiste um problema demográfico gravíssimo mesmo nos municípios que são capitais de distrito: só Braga mostrou, no ano passado, um saldo natural positivo.


Apesar de Portugal ter aumentado a sua população pelo quinto ano consecutivo – e atingido o máximo de sempre nos 10.639.726 residentes no ano passado, de acordo com os recentes dados do Instituto Nacional de Estatística –, o saldo natural em Portugal continua um desastre, com a taxa de natalidade a ficar abaixo da taxa de mortalidade em 3,1 pontos por mil. Mas, pior ainda, o desequilíbrio demográfico é evidente: em 308 concelhos, apenas 16 apresentam um saldo natural positivo. No extremo oposto, estão 93 municípios com um saldo natural negativo de 10 por mil ou menos. Há mesmo cinco onde a diferença entre a taxa de natalidade e a taxa de mortalidade é ainda pior com valores negativos a superarem os 20%.

De acordo com a análise do PÁGINA UM aos dados demográficos de 2023, divulgados pelo INE, o município com maior dinâmica de natalidade é agora Odivelas, que alcançou os 12 nascimentos por mil habitantes, ou seja, nasceram 1.844 bebés. Acurta distância surge Amadora, seu vizinho geográfico, e Albufeira, no Algarve, ambos com 11,4 por mil. Com poucas décimas abaixo encontram-se mais quatro concelhos da Área Metropolitana de Lisboa: Loures (11,3), Moita (11,3), Montijo (11,1) e Sintra (11,1). Só a seguir a estes municípios surge então o concelho que durante décadas liderou o ranking relativo dos nascimentos: Ribeira Grande (10,9 nascimento por mil), que integra a freguesia de Rabo de Peixe, a zona mais pobre de Portugal.

woman and child grayscale photo

Completam o top 10 os municípios do Seixal e Portimão (10,8 e 10,3 por mil, respectivamente), embora haja ainda mais sete concelhos com uma taxa de natalidade de 10 por mil ou superior, nomeadamente Loulé, Barreiro e Aljezur (todos com 11,3), Beja (10,2) e Sobral de Monte Agraço, Lisboa e Mourão (todos com 10,0). Por região, a Grande Lisboa lidera, com uma taxa de natalidade de 10,2 por mil (a única acima de 10). Significa assim que terão nascido na Grande Lisboa, ao longo de 2023, quase 21.700 crianças, ou seja, um em cada quatro nascimentos em Portugal, o que, em certa medida, também explica a saturação dos serviços de obstetrícia observados nesta região.

Se a emigração de população jovem explica em quase todos estes concelhos, estas taxas de natalidade bem acima da média nacional (8,1 por mil), a situação ainda é mais relevante nos casos de diversos concelhos algarvios (Portimão, Loulé e Aljezur), nos dois concelhos alentejanos (Beja e Mourão) e em alguns dos da Área Metropolitana de Lisboa (Moita, Barreiro e Sobral de Monte Agraço e mesmo Lisboa), porque, devido ao envelhecimento populacional das últimas décadas, apresentam uma taxa de mortalidade elevada e, em consequência, até um saldo natural ainda negativo.

No extremo oposto, encontram-se 44 municípios com uma taxa de natalidade inferior a 5 nascimentos por mil habitantes, praticamente todos do interior do Continente e das regiões autónomas. À cabeça aparece Armamar, no distrito de Viseu: numa população de 15.650 habitantes, nasceram apenas 15 crianças ao longo de 2023, o que dá uma taxa de natalidade somente de 2,6 por mil. Não menos pior esteve Vinhais, no distrito de Bragança, com uma taxa de natalidade de 2,7 por mil (20 nascimentos numa população de 7.450). No top 10 dos municípios com menor dinâmica de nascimentos estão ainda Mértola, Alcoutim, Almeida, Montalegre, Pampilhosa, Penalva do Castelo, Vila Nova de Foz Côa e Vila Pouca de Aguiar, com taxas de natalidade entre 3,2 e 3,5 por mil. Para agravar, toos estes municípios, apresentam taxas de mortalidade muito acima da média, pelo que todos apresentam um saldo natural negativo superior a 10%.

Gavião: crianças deste município norte alentejano, na região com pior saldo natural do país. Foto: CM do Gavião.

Em todo o caso, com excepção de Alcoutim, nenhum destes concelhos é dos 10 onde mais se morreu em termos relativos em Portugal no ano passado. A fúnebre lista, por via de uma população idosa e sem jovens, surge encabeçada pelo concelho do Gavião, no distrito de Portalegre, com 30,8 óbitos por mil, quase três vezes superior à média nacional (11,1 por mil). Segue-se Sabugal, no distrito da Guarda, com 26,6 por mil, encontrando-se ainda mais três municípios acima dos 25 por mil: Mora, no distrito de Évora (26,4), Alcoutim, no distrito de Faro (26,3), Aguiar da Beira, no distrito da Guarda (26,3) e Crato, no distrito de Portalegre (26,0). A fechar o top 19 estão ainda os municípios da Vidigueira (24,8), Oleiros (24,4), Melgaço (23,8) e Idanha-a-Nova (23,8), todos do interior,

Contas feitas, por via do cruzamento entre natalidade e mortalidade, somente 16 municípios portugueses apresentaram no ano passado um saldo migratório positivo, sendo liderado por Ribeira Grande (3,6 por mil), seguido por Odivelas (3,1), Albufeira (2,9), Sintra (2,8), Vila Franca do Campo (2,2) e Batalha (2,0). A fechar o top 10 surgem Vizela (1,9 por mil), Amadora (1,6), o município açoriano da Lagoa (1,3) e Loures, Ainda com saldo migratório positivo estiveram Loures (1,2 por mil), Seixal (1,2), Braga (1,2), Vila Franca de Xira (0,9), Paredes (0,5), Montijo (0,4) e Felgueiras (0,3).

No lado oposto, o município que mais população perdeu por via do cruzamento entre a taxa de natalidade e a taxa de mortalidade foi Gavião, que apresentou um saldo natural negativo de 25,7%. Significa que, só por aí, e sem contabilizar o saldo migratório (entrada de novos residente e saída de residentes), este pequeno município norte alentejano perdeu quase 3% da sua população em apenas um ano. Com perdas demográficas, por via do saldo natural, superior a 2 por mil estão ainda Alcoutim (-23,0), Sabugal (-22,5), Aguiar da Beira (-21,6), Crato (-20,5).

Braga: o único município capital de distrito com saldo natural positivo. Foto: CM de Braga.

O problema demográfico, por via do saldo natural, é porem extensível às capitais de distrito, incluindo Lisboa e Porto. Considerando todos os 18 distritos do Continente e os quatro extintos dos arquipélagos, somente o município de Braga teve um saldo natural positivo (1,2 por mil), resultante de uma taxa de natalidade de 8,3 por mil que contrastou com uma taxa de mortalidade de 7,1.

Os municípios de Lisboa e do Porto tiveram um saldo natural negativo de 1,6 e de 4,1 por mil, respectivamente. O município capital de distrito com pior saldo natural foi Castelo Banco com um valor negativo de 8,7 por mil, seguindo-se Portalegre (-8,4), Guarda (-6,8), Bragança (-6,5), Funchal (-4,9), Beja e Vila Real (ambos com -4,8), Santarém (-4,4), Angra do Heroísmo (-4,0), Viana do Castelo (-3,5), Coimbra (-3,3), Horta e Évora (ambos com -3,0), Setúbal (-2,8), Viseu (-2,6), Aveiro (-1,8), Faro (-1,6), Leiria (-1,0) e Ponta Delgada (-0,2).


PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

O jornalismo independente DEPENDE dos leitores

Gostou do artigo? 

Leia mais artigos em baixo.