Rara e desafiante. Esta foi a viagem exclusiva que mais trabalho me deu a organizar e a fazer cumprir. Foram vários dias para preparar um roteiro que orgulhosamente, posso dizer, ninguém fez e nenhuma agência de viagens tem para oferecer.
Éramos 12 e acabámos por viajar 11. Um destino que em parte conheço bem: foi a minha terceira visita ao Reino da Jordânia. Mais de 2000 quilómetros, em oito dias. Aventuras, imprevistos, algum stress, planos B, partilha, contemplação, amizade e amor. E a mais difícil fronteira terrestre que alguma vez atravessei.
Foi uma viagem sem preço, onde o céu do deserto abana as estruturas enquanto a riqueza cultural que trazemos no regresso a casa, não tem tamanho.
Apertem os cintos, preparem as pipocas e deliciem-se com uma das minhas maiores aventuras de sempre.
Partimos do Aeroporto de Lisboa, Terminal 2, Lisboa-Ciampino (Roma, Itália), com a Ryanair, a companhia aérea que não ofende, não quer ser mais do que o que é e, normalmente, chega sempre a horas.
De Roma, depois de uma pasta pomodoro no centro da cidade, seguimos para o Chipre, onde passámos a primeira noite antes de um voo de 1h30 nos colocar no Reino da Jordânia.
Da janela do avião vislumbram-se as pedras rosas, os terrenos áridos e tinha-se a sensação de se chegar a outro planeta.
Depois de recolhermos os dois carros, um de nove e outro de cinco lugares, iniciámos a nossa viagem com uma pequena paragem em Little Petra que, como o nome indica é uma Petra em ponto pequeno.
Estávamos perto da hora de encerramento, portanto estivemos com os monumentos só para nós. À saída, cruzamo-nos com autocarros que traziam turistas para jantar em frente aos monumentos, um sinal da afluência turística e do vale quase tudo por estas bandas.
Mais 20 minutos de caminho e chegávamos ao Infinity Lodge, onde reencontrei o meu guia das últimas duas vezes em Petra, agora com uma filha de dois anos, a mulher e proprietário do Hotel Small World, também em Petra.
Serviram-nos um jantar típico, com frango e borrego e algumas entradas, alguns doces do Médio Oriente, chá e café.
Petra by Night estava quase a começar e lá fomos nós – desde o centro de visitantes são quase 30 minutos – pelos canyons outrora iluminados com velas e hoje com efeitos sonoros especiais, turistas barulhentos e lanternas de telemóveis a iluminar o caminho.
Ninguém quer saber e chegados ao Treasury, o beduíno que outrora tocava flauta num silêncio que nos levava para outra dimensão, foi substituído por amplificadores e um sistema de luz que mais parecia o Museu do Futuro no Dubai.
Havia polícias a controlar os beduínos, que costumavam fazer as honras da cidade perdida. Um terraço com guarda-sóis, lojas e até carrinhos de golfe para facilitar o caminho, de forma sustentável (dizem eles).
A Petra by Night que tive o privilégio de conhecer não existe mais e não vale a pena do bilhete nem a caminhada.
Regressámos ao hotel onde terminei as últimas combinações com Ali, o beduíno que nos levaria a Petra pelo sentido contrário, para assim conseguirmos apreciar a cidade com o mínimo de pessoas possível.
Depois de um pequeno-almoço do Médio Oriente – ou seja, mistura de salgado e doce, regado a sumos de laranja, chá e café – começámos a nossa aventura. Como habitual, à hora combinada, chegamos à Beduin Village e dali partimos em duas carrinhas pickup para a entrada de Petra, que nos levaria até ao Monastery.
Foi cerca de uma hora de caminhada, com grau de dificuldade médio, grau este agravado pelo calor que começava a fazer-se sentir, mas, a vista compensava. A caminhada por entre canyons, vistas de cortar a respiração e o deserto de Aqaba como derradeiro vislumbre. Um sonho!
Parámos numa tenda a meio do caminho onde retemperámos energias com água, café, chá e fizemos algumas compras. Eu apenas comprei duas moedas dos Nabateus.
Chegámos ao Monastery. A vista era inacreditável e a afluência já era grande. Os cafés de outrora tinham o dobro do caminho, os sumos de romã, laranja ou lima não continuam a cumprir o seu propósito.
Reencontro o Beduíno que me guiou nas últimas vezes. Não se lembra de mim, desculpa-se dizendo: “é muita gente todos os dias”. Sentimo-nos uma versão fast da humanidade: os turistas iguais a todos enquanto nós os levamos nas memórias e no coração. Conta que casou com a namorada dinamarquesa. O amigo Raaed vive com uma italiana. Um mistério e tradição antiga, os beduínos casarem com ocidentais.
Começámos a descida para o centro da cidade de Petra, onde almoçámos num género de cantina com capacidade para servir 100 pessoas de cada vez. Indescritível a proliferação de visitantes a Petra.
Agora era o momento de nos cruzarmos com a quantidade de turistas que seguia para o Monastery e quando chegámos ao Treasury, ainda que com muitos visitantes, eram muito menos dos que chegaram de manhã, desde o momento da abertura de portas.
Ali, Ibrahim esperava por nós para nos levar a uma das vistas mais bonitas para o Treasury: o monumento mais emblemático de Petra.
Tapetes, almofadas e sofás tornavam as pedras acolhedoras e com os beduínos sentimo-nos em casa.
Os beduínos são a alma de Petra, a sua generosidade, disponibilidade e amizade é algo que levo comigo para sempre. O seu jeito nómada e livre faz de Petra um dos lugares mais genuínos de sempre e onde o passado, o presente e o futuro se cruzam ao mesmo tempo. A cidade rosa perdida que sempre adorarei.
O regresso até aos carros foi feito de burro, uma beleza de caminho e ver as faces dos companheiros de viagem que já não eram os mesmos que entraram na cidade. Petra não deixa ninguém indiferente.
Seguimos duas horas de caminho até ao deserto, onde vivemos uma das experiências mais incríveis de sempre. Ficámos no local onde foi filmado o filme Perdido em Marte e, era a Marte que parecia termos chegado.
A tenda dome dava um carácter especial. Ali, definitivamente, o menos é mais. E a noite quente e o céu estrelado foram o palco perfeito para uma contemplação única. A energia das estrelas tirou o sono a quase todos, mas sentíamo-nos energizados quase como por magia. Ali estamos frente a frente para o cosmos, e é ali onde nos sentimos mais perto da eternidade. Uma noite para a história das nossas vidas.
No silêncio do dia que amanhecia tivemos uma aula de ioga muito especial, adequada ao momento que vivemos, e preparamo-nos para um dia de aventura no deserto. Passeio de Jipe 4×4, almoço, tarde no deserto do Lawrence das Arábias, com final de tarde de camelo até ao local onde avistávamos um pôr-do-sol memorável.
Dali seguimos para um agradável Aladin Beduin Camp, onde jantámos e pernoitámos para, no dia seguinte, muito cedo partirmos rumo à Arabia Saudita.
Raquel Rodrigues é gestora, viajante e criadora da página R.R. Around the World no Facebook e no Instagram.