Pelo que vou lendo por aí, há uma certa alegria no facto de Pedro Nuno Santos ter apresentado a sua demissão. Confesso que não entendo bem o motivo de tantos sorrisos pela queda do único ministro que ainda se preocupava com a coisa pública.
Uma coisa é ele não ter alternativa; outra é acharmos que isso é bom para o Governo ou sequer para o país.
Na dúvida sobre onde está a razão, há que seguir a regra de polegar aplicada ao Ventura: se ele grita e tenta atirar ao chão, então, em princípio, é algo que nos fará falta; se ele fica em silêncio, e finge que não é nada com ele, é porque estamos a ser assaltados sem dar por ela. Certinho como o Enzo Fernández já não vestir de vermelho em Janeiro (maldito Mundial).
E reparem na ironia que recai sore Medina, o delfim do Costa, que também já tem as suas clientelas estabelecidas (alô Serginho!) e, só por acaso, tirou a Xana Maria da NAV e a encaixou no Governo. O que lhe acontece? Nada, absolutamente nada. Vai passar por isto como um gato num chuveiro. Nem uma pinga lhe toca. Não só se livra de um opositor à sucessão do Costa como aguenta o lugar que lhe foi oferecido depois da estrondosa derrota em Lisboa.
Medina é a garantia que temos Homem do Regime para a próxima travessia do deserto do PS (Ventura e Montenegro, eventualmente, chegarão lá) e a estocada final na discussão de quão à esquerda se situava este Governo. Está ali firme, muito firme, ao centro e a secar o PSD no seu próprio território.
Num Governo absolutamente entupido de escândalos e má gestão de dinheiro público (para não lhe chamar outra coisa), havia um ministro (Pedro Nuno Santos) que ainda se preocupava com o lado certo da questão. Ou que, pelo menos, fazia o que podia para defender o interesse público e o investimento em estruturas, que, de alguma forma, nos pudessem beneficiar enquanto sociedade contribuinte.
Não era por aquele lado que se distribuía dinheiro público pelas clientelas ou, sequer, que se favoreciam alguns grupos ou amigos na distribuição dos subsídios europeus.
Levantou a voz quando tinha de levantar e aceitou algumas humilhações, quando, provavelmente, deveria ter batido com a porta. Parecia-me um homem que nos servia em vez de se servir. Não é um detalhe nos tempos que correm.
Agora está fora. Ficam os distribuidores de jogo, os garantes de que os impostos continuam a beneficiar uma minoria, uma elite que enriquece às nossas custas. E o melhor? É ver a opinião pública a achar que ficámos melhor, ou a direita a cavalgar a onda do populismo, sabendo perfeitamente que os boys ficam exactamente no mesmo sítio.
Visto assim, aquela de se venderem cortes nas pensões como se fossem aumentos, até me parece de bom gosto.
Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)
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