VISTO DE FORA

New Year, New Me? Nem por isso…

person holding camera lens

por Tiago Franco // Janeiro 1, 2023


Categoria: Opinião

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O diretor do PÁGINA UM cometeu o erro: pediu um balanço do ano de 2022 a alguém que não vê grandes diferenças entre o 31 de Dezembro e o primeiro dia de Janeiro. Nunca dei grande importância à mudança de ano e os balanços acontecem, na minha cabeça, sem hora ou dia marcado.

Acho que estou a tentar perceber o que se tem passado desde Abril de 2020, altura em que me juraram que vivia num país (Suécia) onde o Governo matava velhinhos para poupar nas pensões de reforma. De modo que, aqui para nós, ando a fazer contas à vida pessoal, profissional e aquela que me rodeia há quase três anos.

yellow fireworks in the sky during nighttime

Entre dúvidas dos caminhos que devo seguir e das opções que a emigração me impõe, tenho duas certezas, que nem por isso me ajudam muito. Os últimos três anos foram os melhores da minha vida profissional e os piores do Mundo como eu o conhecia. Ou como achava que conhecia.

O ano de 2022 foi um espelho dessa realidade. A minha vida profissional deu uma volta onde tudo, bem, quase tudo, o que esperava finalmente aconteceu, e, quase em paralelo, a vida no continente europeu foi-se degradando em cada semana, com o alargamento da guerra na Ucrânia e as facturas que entretanto chegaram após dois anos erráticos de confinamentos.

A população empobreceu. A população que andou a fazer o que os governantes mandaram, em nome de um ridículo “vamos todos ficar bem”, passaram 2022 a ouvir que, “as long as it takes“, teriam de continuar a pagar uma guerra que não escolheram, e assim continuar o caminho iniciado em 2020 que resultou num condicionamento da liberdade individual, desemprego, aumento do custo de vida, endividamento dos países, mais impostos, inflação, salários devorados e aumentos insuficientes. Numa palavra: empobrecimento.

man wearing panda costume leaning on post

Como será em 2023?

Em princípio pior.

A guerra parece não ter fim à vista e, como nos mostraram os directos, há um regozijo geral em ver Zelensky a receber mísseis Patriot no Senado norte-americano. Alguém achará que isto é o bem comum: a defesa da União Europeia e mais uma série de balelas que nos vão vendendo para justificar a negociata. Como acharão outros que devem continuar a comprar energia russa e a alimentar a economia de guerra. No fundo, se cada nação fizer o seu negócio, o que lhes importa o sofrimento alheio?

No caderno de História da minha filha via os loucos anos 20 do século passado. Por lá, o historiador de serviço classificava as várias consequências do resultado da Primeira Guerra Mundial. Dizia-se que “a Europa saía endividada e os Estados Unidos credores”. Ora, 100 anos depois estamos no mesmíssimo filme com a diferença de acharmos, nós europeus, que nos estão a fazer um favor ao segurar os russos no Donbass.

Quer dizer… sei lá eu se isso será diferente ou não. Provavelmente em 1913 também alguém andava a dizer que aquele Francisco Fernando estava a pedi-las e era um agente secreto dos bolcheviques. E aposto que uma trisavó da Helena Ferro Gouveia defendia em 1905 que vender ferro aos alemães era imperioso, porque eles seriam o tampão à expansão dos Czares russos na Península Ibérica. Imagino que, em todas as eras, existam sempre os visionários com informações privilegiadas que atiram um pouco (ou muito) ao lado.

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Bom… mas já me desviei do tema – como é, infelizmente, meu apanágio.

Hoje, 1 de Janeiro de 2023, o que se espera de diferente dos 365 dias do ano anterior? Muito pouco.

Eu estou a contar com incêndios em Agosto e cheias em Novembro.

Conto ver mais uns abusos do Erário Público e uns quantos secretários de Estado de bolsos cheios. Imagino mais umas quantas machadadas no Serviço Nacional de Saúde (SNS) e um batalhão de gajos da Medicare a chatear o pessoal nos centros comerciais.

[Um deles, em Almada, abordou-me para me informar que, além do seguro de saúde, ainda tinha descontos na Adidas. Embrulha, SNS!]

Vou ver mais uns quantos putos, fresquinhos das universidades e com zero dias na carreira contributiva em Portugal, a pegarem na mala que a Linda de Suza acabou de deixar vazia.

Rezo aos santos, quaisquer que sejam, para a taxa de juro não ultrapassar os 5% (como se isso fosse um valor aceitável), e espero mesmo que, no meio da loucura geral, os chineses não sejam arrastados para confusões em Taiwan. O meu emprego depende do investimento chinês na Europa, portanto perdoem-me este momento de algum egoísmo, mas a mim, até ver, ninguém perdoa créditos.

[Também não é culpa vossa que não os tenha pedido ao BES; aceito essa falha da minha parte.]

woman riding escalator

Imagino manifestações todos os meses e salários cada vez mais miseráveis. Aliás, acho mesmo que chegámos a um ponto em que se esgotaram as hipóteses de negociação com as elites. São poucos, muitos poucos, os que conseguem ter uma vida confortável em Portugal e não parecem, em momento algum, querer abdicar disso pela via da negociação e da repartição justa de riqueza.

Em suma, minhas caras amigas e meus caros amigos, acho que 2022 foi, em geral, uma merda. E imagino que 2023 não mude de aroma.

Confesso que não ando muito optimista. Diz agora o estimado leitor: “olha, nem tinha reparado!”.

E mais digo: este é o tipo de pensamentos que me ocupa a mente grande parte do dia. Todos os dias, semanas e meses – desde que entrámos neste novo normal de empobrecer, pedir licença para sair de casa ou achar normal não poder tocar em familiares mais velhos.

Entretanto, anteontem descia eu a rua principal da “minha ilha” quando o repórter da RTP Açores me abordou de câmara ao ombro. Digo o repórter porque só existe um, e todos sabemos quem ele é. São menos de cinco mil habitantes e identificamos, por nome ou família, quem faz o pão ou nos martela a cerca, quem bate na chapa do carro ou quem nos arranja as pontas secas do cabelo. Em poucos segundos e sem que eu esperasse, ele diz: “Desejos para 2023 e uma mensagem de Ano Novo…”.

black condenser microphone

Eu, sem pensar muito, disse: “Saúde para todos, fim da guerra na Ucrânia e a baixa das taxas de juro”. São os três temas que influenciam a vida de maior parte das pessoas, julgo eu. Tendo consciência disso ou não, somos todos afectados pelas decisões de Bruxelas, Washington e Moscovo.

Adorava ser aquele gajo que chega ao primeiro de Janeiro e vive a personagem do “New Year, New Me”, e nos enche de optimismo daquele mundo das misses. Mas não sou.

Prometo muito voltar a tentar em 2024.

Até lá, para quem trabalha e depende disso para uma vida com dignidade, não desistam de lutar.

Um bom ano para todos!

Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

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